Supremo Tribunal Federal • 16 julgados • 15 de dez. de 2006
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O Tribunal, por maioria, deferiu pedido de medida cautelar formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Procurador-Geral da República para suspender a eficácia da Resolução 15/2006, do Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP, que, retificando os artigos 1º e 2º da Resolução 9/2006 e o art. 2º da Resolução 10/2006, ambas do CNMP, e dando-lhes nova redação, dispõe sobre o valor do teto remuneratório dos membros e servidores do Ministério Público da União e dos Estados. Entendeu-se que a norma impugnada, a princípio, ofende os artigos 37, X, XI, § 12 e 130-A, § 2º, todos da CF, porquanto não observa o princípio da legalidade específica para a definição dos valores a serem pagos a título de remuneração ou subsídio dos agentes públicos, bem como extrapola os limites tanto de subsídio e remuneração previstos para os membros e servidores do Ministério Público dos Estados — 90,25% do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do STF — quanto de competência do CNMP. Vencido, em parte, o Min. Marco Aurélio, que restringia o deferimento da medida cautelar à disciplina que alcança o Ministério Público dos Estados.
O Tribunal, por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão da Min. Ellen Gracie, Presidente, que deferira suspensão da execução de decisão concessiva de efeito suspensivo ativo proferida pela relatora de agravo de instrumento interposto, perante o TRF da 1ª Região, contra despacho de indeferimento do pedido de antecipação dos efeitos da tutela formulado em ação civil pública. Na espécie, o Sindicato Nacional dos Aeronautas ajuizou ação civil pública na qual pede a declaração de responsabilidade da União por atos tidos por ilegais, lesivos e irregulares praticados pela Secretaria de Previdência Complementar do Ministério da Previdência e Assis¬tência Social e pela interventora do Ministério da Previdência em fundo de previdência complementar, instituído com a participação de empregados e dirigentes de viação aérea. A decisão concessiva de efeito suspensivo do agravo de instrumento determinara que a União mantivesse os pagamentos de complementação de aposentadorias, pensões e auxílios-doença, até decisão final da ação principal. Afastou-se, em primeiro lugar, a alegação de não cabimento do pedido, considerada a natureza monocrática da decisão suspensa, haja vista a superação desse entendimento pela jurisprudência da Corte, firmada a partir do julgamento da Pet 2455 AgR/PA (DJU de 1º.10.2004). Em seguida, rejeitou-se a apontada incompetência da Presidência do STF para apreciação do pedido, tendo em conta a existência, na causa, de matéria de índole constitucional: responsabilidade civil do Estado (CF, art. 37, § 6º) e questões concernentes ao regime de previdência privada (CF, art. 202). Quanto à assertiva de que a tutela antecipada apenas garantira o adiantamento de pequena parte da indenização que pretende obter naquela ação proposta, entendeu-se que o que se teve foi uma difusa e precoce declaração judicial de responsabilidade civil da União que, na fase inicial do processo, já se vira obrigada, a aportar significativos recursos públicos para a manutenção da sobrevivência financeira de entidade de previdência privada em liquidação extrajudicial, o que seria expressamente vedado pelo art. 202, § 3º, da CF. Considerou-se, em razão disso, configurada lesão à ordem pública. Reconheceu-se, também, ter havido lesão à ordem administrativa, ao fundamento de que forçar a continuidade de sistema previdenciário fechado já em regime de liquidação extrajudicial decretada, conduzida e executada pelo próprio Poder Público, cria dificuldade no alcance do objetivo esperado no processo de liquidação. Vencidos, em parte, os Ministros Sepúlveda Pertence, Cármen Lúcia e Eros Grau, que, afirmando que as suspensões são contracautela de eventual recurso extraordinário, davam provimento parcial ao recurso para limitar no tempo a decisão agravada até o julgamento dos agravos interpostos perante o TRF da 1ª Região, quando, então, consideraram ser mais fácil verificar a viabilidade desse recurso extraordinário. Vencido, também, o Min. Marco Aurélio que dava provimento ao recurso, para restabelecer a liminar deferida pelo TRF da 1ª Região, por entender que a matéria deveria ser, por primeiro, julgada no TRF, considerados os agravos lá interpostos, para vir-se, se o caso, ao STF, por meio de recurso extraordinário, e, salientando ser a suspensão medida excepcional por implicar queima de etapas, não vislumbrava situação a extravasar a razoabilidade, haja vista a intervenção no fundo pelo Poder Público durante 10 anos e a responsabilidade a se chegou, mantendo-se o status quo ante de complementação.
Não é cabível agravo regimental contra decisão proferida em agravo de instrumento que determina o processamento de recurso extraordinário para melhor exame, excetuadas as hipóteses relativas aos pressupostos de conhecimento do próprio agravo de instrumento. Com base nesse entendimento, a Turma desproveu agravo regimental em agravo de instrumento em que se pleiteava a reconsideração da decisão que determinara a subida dos autos principais, para melhor exame do recurso extraordinário.
O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público - CONAMP para, sem prejuízo da atribuição do Ministério Público Federal da veladura pelas fundações federais de direito público, funcionem, ou não, no Distrito Federal ou nos eventuais Territórios, declarar a inconstitucionalidade do § 1º do art. 66 da Lei 10.406/2002 (novo Código Civil) —, que prevê que o MPF velará pelas fundações que funcionarem no DF ou em Território. Inicialmente, afastou-se a alegação de ofensa ao art. 128, § 5º, da CF, ao fundamento de que tal assertiva é elidida pelo art. 129 da CF que, depois de enumerar uma série de funções institucionais do Ministério Público, admite, em seu inciso IX, que a elas se acresçam a de exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, vedadas a representação judicial e a consultoria públicas. No ponto, asseverou-se tratar-se de “norma de encerramento” que, ao não exigir explicitamente lei complementar, permite que leis ordinárias aditem novas funções às diretamente outorgadas ao Ministério Público pela CF. Por outro lado, entendeu-se que a norma impugnada discrepa do sistema constitucional de repartição de atribuições de cada corpo do Ministério Público, que corresponde substancialmente à distribuição de competência entre Justiças da União e a dos Estados e do DF, e, no qual, a área reservada ao MPF é coextensiva, mutatis mutandis, aquela da jurisdição da Justiça Federal comum e dos órgãos judiciários de superposição — o STF e o STJ. Salientou-se que, malgrado compreendido o MPDFT, no plano administrativo, no MPU, a Constituição a ele reservou âmbito funcional coextensivo ao do Ministério Público dos Estados, isto é, coincidente a esfera material e territorial da competência da Justiça dos Estados-membros, ressaltando o que disposto no art. 128, § 3º, da CF. Assim, não obstante reserve à União organizá-lo e mantê-lo (CF, art. 21, XIII), é do sistema da Constituição que se infere a identidade substancial da esfera de atribuições do MPDFT àquelas confiadas ao MPE, que, à semelhança do que ocorre com o Poder Judiciário, se apura por exclusão das correspondentes ao Ministério Público Federal, ao do Trabalho e ao Militar. Concluiu-se, dessa forma, que o critério eleito para definir a atribuição questionada, qual seja, funcionar a fundação no DF, peca de um lado, na medida em que há fundações de direito público, instituídas pela União — e, portanto, integrantes da Administração Pública Federal e sujeitas, porque autarquias fundacionais, à jurisdição da Justiça Federal ordinária —, mas que não têm sede no DF, e por outro lado, na medida em que a circunstância de serem sediadas ou funcionarem no DF não é bastante nem para incorporá-las à Administração Pública da União — sejam elas fundações de direito privado ou fundações públicas, como as instituídas pelo DF —, nem para submetê-las à Justiça Federal.
O Tribunal recebeu, em parte, embargos de declaração opostos pelo Procurador-Geral da República contra o acórdão proferido em ação direta ajuizada pela Confederação Nacional das Instituições Financeiras - CONSIF na qual se objetivava a declaração de inconstitucionalidade da expressão “inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária”, constante do art. 3º, § 2º, da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) — v. Informativos 264, 417, 425 e 430. Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, não conheceu dos embargos opostos pelo Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor - BRASILCON e pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor - IDEC, por considerar que ambos, na qualidade de amici curiae na referida ação direta, não teriam legitimidade para recorrer. Vencido, no ponto, o Min. Carlos Britto que conhecia dos embargos, ao fundamento de que, no processo objetivo, haveria a legitimidade. No mérito, os embargos declaratórios foram acolhidos para esclarecer-se que a ação direta foi julgada improcedente e que não houve interpretação conforme. Não obstante afirmando que dizer que qualquer preceito de lei ordinária deve ser interpretado em coerência com a Constituição não significa se esteja a propor a interpretação conforme a esse preceito, entendeu-se que a ementa do acórdão, da forma como redigida nos seus itens 3 e 6, por afastar possibilidade interpretativa, seria mais compatível com o julgamento de procedência parcial, mediante interpretação conforme sem redução de texto. Em razão disso, e, ainda, tendo em conta restar demonstrada, nos debates, a existência de dispersão de fundamentos quanto a outros itens, resolveu-se reduzir a ementa ao conteúdo dos itens em relação aos quais todos os Ministros estavam de acordo.
Não cabe recurso extraordinário da decisão singular proferida por relator que denega provimento a agravo de instrumento interposto com o fim de destrancar recurso especial inadmitido na origem, porquanto ainda cabível o manejo de agravo regimental junto ao órgão colegiado do STJ. Com base nesse entendimento, a Turma, aplicando o Enunciado da Súmula 281 do STF (“É inadmissível o recurso extraordinário, quando couber, na justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada.”), negou provimento a agravo regimental em agravo de instrumento em que se alegava o exaurimento das vias recursais perante o STJ. Considerou-se que decisão de “única ou última instância” susceptível de recurso extraordinário (CF, art. 102, III) é aquela contra a qual não caiba recurso ordinário no órgão de que provenha.
O Tribunal concluiu julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente da Câmara dos Deputados e do Diretor do Departamento de Pessoal dessa Casa Legislativa que reajustara os proventos da impetrante em obediência a decisão do Tribunal de Contas da União. Na espécie, o TCU reputara ilegal a incorporação de “quintos” pela impetrante, em razão da falta de um dia para o implemento do requisito temporal exigido para a aquisição da vantagem, e determinara a devolução dos valores percebidos — v. Informativo 424. Por considerar presente a boa-fé da impetrante, concedeu-se a ordem, para determinar que a autoridade coatora restitua as quantias descontadas durante o período de seu pagamento até a data da publicação da decisão do TCU. Reconheceu-se, ademais, o direito à incorporação da vantagem, ao fundamento de que, no caso, em razão de a impetrante ter trabalhado no dia em que publicado o ato de sua aposentadoria, bem como em dias subseqüentes, o tempo de exercício de fato da função pública, por gerar conseqüências, inclusive para fins de responsabilização por condutas ilícitas, deveria ser contado. O relator reajustou seu voto.
A Turma recebeu embargos de declaração em agravo regimental em agravo de instrumento para excluir multa por litigância de má-fé (CPC, art. 17) aplicada pelo Presidente do STJ que, em juízo primeiro de admissibilidade, denegara subida de recurso extraordinário por considerá-lo manifestamente protelatório. Entendeu-se que a imposição de multa pelo tribunal de origem invade a competência constitucional atribuída ao STF, porquanto a referida sanção deve ser aplicada por aquele que detém o juízo definitivo de admissibilidade do recurso. Asseverou-se, ainda, que o exame de admissibilidade efetuado pelos tribunais inferiores tem natureza provisória e deve limitar-se à análise dos pressupostos genéricos e específicos de recorribilidade do extraordinário.
A Turma deferiu habeas corpus para trancar ação penal instaurada contra denunciados pela suposta prática do delito de estelionato, em concurso de pessoas (CP, art. 171, caput, c/c art. 29), em decorrência do não adimplemento de compromissos firmados por sua empresa, quando da abertura de outra sociedade, para a qual teriam transferido parte do patrimônio daquela. Considerou-se que, na espécie, a denúncia consistiria em mera presunção no tocante ao cometimento de estelionato, atribuindo aos pacientes, por suposição, a atuação com dolo específico para obter vantagem ilícita, invertendo, assim, o ônus da prova, em seu desfavor, de modo que a eles caberia provar a ausência de tal dolo. Salientou-se, ainda, que a abertura de empresa, por si só, não configuraria crime e que inexistiria, nos autos, notícia de que a sociedade credora tivesse recorrido às vias judiciais para cobrar seus créditos, a qual poderia socorrer-se, caso infrutífera esta iniciativa, do dispositivo do art. 50 do CC, que prevê a desconsideração da personalidade jurídica. Concluiu-se não se estar diante de conduta atípica dos pacientes, cuja análise não seria viável em habeas corpus, mas de inépcia da peça acusatória.
O termo instância previsto no art. 252, III, do CPP (“Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no mesmo processo em que:... III - tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão;”) abrange as esferas administrativa e judicial. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática dos crimes de falsificação de documento público e de peculato que, em julgamento de apelação criminal, tivera como vogal o mesmo magistrado que anteriormente fora relator de recurso hierárquico por ele interposto, em sede administrativa, contra decisão que o demitira do cargo de serventuário da justiça — v. Informativo 432. Entendeu-se violado o citado art. 252, III, do CPP, em virtude do impedimento do magistrado. Asseverou-se que as considerações do desembargador no julgamento do recurso administrativo, no mínimo, tangenciaram o mérito da ação penal, o que prenunciaria ao paciente que um dos votos, de pronto, lhe seria desfavorável. Dessa forma, restaria inobservado o princípio do devido processo legal. Por fim, salientou-se que a presente hipótese seria semelhante àquela em que o magistrado, na primeira instância, não decide o mérito da ação penal, mas adota medida que interfere na esfera jurídica do acusado, vindo, posteriormente, a participar do julgamento no segundo grau de jurisdição. HC deferido para, declarando nulo o acórdão proferido, determinar a realização de novo julgamento e ordenar a imediata soltura do paciente se por al não estiver preso.
A Turma recebeu segundos embargos de declaração e, em conseqüência, deferiu habeas corpus para trancar ação penal instaurada contra denunciado pela prática do crime de uso de documento falso (CP, art. 304, c/c art. 297), pela circunstância de haver apresentado à Delegacia da Receita Federal recibo relativo à falsa declaração retificadora do imposto de renda, utilizada para impugnar auto de infração pela não-declaração de rendimentos tributáveis, em inquérito promovido para apurar seu suposto enriquecimento ilícito no exercício do cargo de juiz. No caso, a Turma, em votação majoritária, acompanhando o voto-vista do Min. Carlos Velloso, indeferira o writ por considerar que o delito de uso de documento falso seria conduta autônoma, podendo resultar, em tese, além de crime contra a ordem tributária, em outros delitos decorrentes do enriquecimento ilícito, que o pagamento do tributo não elidiria. Na ocasião, ficara vencido o Min. Gilmar Mendes, relator, que o deferia por entender aplicável o princípio da consunção e, tendo em conta a comprovação nos autos de que houvera integral pagamento do tributo, declarava extinta a punibilidade — v. Informativos 341 e 346. Os primeiros embargos de declaração opostos foram rejeitados ao fundamento de inocorrência dos seus pressupostos. Em face da aposentadoria do Min. Carlos Velloso, os autos foram redistribuídos a um dos ministros componentes da Turma, sendo sorteado o Min. Gilmar Mendes. O embargante sustentava, na espécie, incoerência lógico-jurídica do acórdão embargado e erro material consubstanciado na consideração de pressuposto de fato inexistente, o qual consistiria na equívoca premissa de que o paciente teria apresentado declaração retificadora questionada em investigação que poderia resultar, em tese, em mais de um delito. Inicialmente, aduziu-se que, quando do julgamento dos primeiros embargos de declaração, existiam contra o embargante dois inquéritos em andamento perante o STJ: um referente ao suposto crime de enriquecimento ilícito e outro relacionado ao delito de sonegação fiscal e uso de documento falso. Por falta de justa causa para a ação penal, aquele primeiro inquérito fora posteriormente arquivado a pedido do Ministério Público, que ressaltara que eventuais ilícitos deveriam ser apurados no bojo de ação de improbidade administrativa já instaurada naquela Corte. Tendo em conta este arquivamento, entendeu-se não ser mais possível reconhecer a plausibilidade da proposição condutora do acórdão embargado, porquanto inviável a invocação de existência, em tese, de outros delitos a embasar o reconhecimento da autonomia do crime de falso. Diante desse fato novo apto a afastar a premissa lógico-jurídica em que se fundara o acórdão embargado, conferiram-se efeitos infringentes aos embargos de declaração para acolher o voto vencido do Min. Gilmar Mendes naquela assentada.
A Turma deferiu habeas corpus para trancar ação penal instaurada contra o paciente que, na qualidade de diretor de empresa, fora denunciado pela suposta prática de cri¬me contra a ordem tributária (Lei 8.137/90, art. 1º, I e II), consistente na simulação de negócio jurídico para remessa de dinheiro ao exterior. Tratava-se de writ impetrado contra acórdão do STJ que negara provimento a recurso ordinário em idêntica medida, ao fundamento de que o lapso temporal de 12 dias entre a renúncia do paciente ao cargo e a realização desse contrato seria insuficiente para garantir a sua não participação nos mencionados delitos. Não obstante a desenvoltura operacional da empresa e a regra do art. 151 da Lei 6.404/76 (“A renúncia do administrador torna-se eficaz, em relação à companhia, desde o momento em que lhe for entregue a comunicação escrita do renunciante, e em relação a terceiros de boa-fé, após o arquivamento no Registro do Comércio e publicação, que poderão ser promovidos pelo renunciante.”), entendeu-se incabível a responsabilização do paciente pelo crime, haja vista que, na época de sua prática, ele não mais possuía qualquer poder de administração e, consoante demonstrado no tribunal de origem, o acordo fora subscrito por outros diretores da empresa. Nesse sentido, considerou-se que, embora graves os fatos narrados, eles não têm o condão de, por si sós, permitirem a deflagração da ação penal contra o paciente, sem que comprovada a tese de que ele teria, de alguma forma, continuado a manter controle das operações da sociedade.
A Turma deferiu habeas corpus para declarar extinta, por efeito da consumação da prescrição da pretensão punitiva, a punibilidade de prefeito condenado, em ação penal originária, pelo tribunal de justiça local, à pena de 4 anos de reclusão pelos crimes previstos no art. 1º, I, do Decreto-lei 201/67, duas vezes, em concurso material. No caso, o Ministério Público Estadual interpusera recurso especial somente para questionar a absolvição do paciente por determinado delito e postular a aplicação da pena de inabilitação, pelo prazo de 5 anos, para o exercício de cargo ou função pública, sendo este último pedido provido. Tendo em conta que a sanção cominada para cada crime fora de 2 anos e que não houvera impugnação recursal do parquet quanto a sua fixação, asseverou-se que, consoante prescrevem as normas inscritas no art. 110, § 1º, c/c o art. 109, V e no art. 119, todos do CP, a prescrição consumar-se-ia em 4 anos. No ponto, aduziu-se que, em se tratando de delitos em concurso material, incide, na espécie, o mencionado art. 119 do CP, que impõe que o lapso prescricional seja calculado separadamente, em função da pena imposta a cada um dos crimes. Com base nisso e considerando que o acórdão condenatório fora proferido em 1998, entendeu-se consumada a prescrição penal, uma vez que, até a presente data, a execução da sanção imposta ao paciente sequer se iniciara.
A partir da edição da Lei 9.271/96, que incluiu o § 4º ao art. 370 do CPP, os defensores nomeados, dentre os quais se inclui o defensor dativo, passaram também a possuir a prerrogativa da intimação pessoal. Com base nesse entendimento, a Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia a anulação de ação penal, em virtude da ausência de intimação pessoal de defensor dativo para o julgamento de apelação. Sustentava-se, na espécie, a obrigatoriedade dessa intimação, sob o argumento de que a Lei 1.060/50 não fez distinção entre defensores dativo e público. Considerando que, no caso, a intimação do defensor dativo da pauta de julgamento da apelação ocorrera, via publicação no Diário de Justiça, em data anterior ao advento da mencionada Lei 9.217/96, entendeu-se incidente o princípio do tempus regit actum, a afastar a exigência legal. Vencido o Min. Marco Aurélio que, tendo em conta a peculiaridade da inexistência, à época, de defensoria pública no Estado de São Paulo, deferia o writ para tornar insubsistente o julgamento da apelação, determinando que outro se realizasse com a intimação pessoal do defensor dativo, ao fundamento de que a Lei 1.060/50 previa não só a intimação do próprio defensor público, como também daquele que atuasse em sua substituição.
Em conclusão de julgamento, a Turma, por maioria, deu parcial provimento a recurso ordinário em habeas corpus interposto pelo Ministério Público Federal para que, mantida a competência da Justiça Estadual, seja revogada a prisão preventiva decretada contra índios denunciados pela suposta prática de furto qualificado de duas reses de gado (CP, art 157, § 2º, I e II) — v. Informativo 395. Preliminarmente, afastou-se a tese de impossibilidade de conhecimento do recurso, em face da supressão de instância, ao fundamento de se estar diante de matéria de ordem pública. No mérito, tendo em conta precedentes do STF no sentido do deslocamento da competência para a Justiça Federal somente quando o processo versar sobre questões diretamente ligadas à cultura indígena, aos direitos sobre suas terras ou a interesses da União, entendeu-se que, no caso, inexistiria violação a bem jurídico penal que demandasse a incidência da Justiça Federal, haja vista cuidar-se de ofensa a bens semoventes de propriedade particular. No tocante ao pedido de revogação da custódia cautelar, ressaltou-se que a questão sobre maus antecedentes não se encontra pacificada na Corte e que a possibilidade de se aguardar, em liberdade, o julgamento de apelação está sendo discutida pelo Plenário (Rcl 2391/PR, v. Informativo 334). Não obstante, considerou-se que a mera existência de inquéritos ou ações penais em andamento não poderia ser reputada como caracterizadora de maus antecedentes, de modo a embasar o decreto de prisão preventiva dos pacientes, sob pena de se violar o princípio constitucional da não-culpabilidade (CF, art. 5º, LVII). Vencido, em parte, o Min. Joaquim Barbosa, relator, que, ressaltando que o delito fora praticado em meio à disputa de terras indígenas, dava integral provimento ao recurso para declarar a incompetência da Justiça Estadual, determinando a remessa dos autos à Justiça Federal, assim como para revogar a prisão preventiva, já que decretada por autoridade absolutamente incompetente, além de não preencher os requisitos legais.
A Turma, por maioria, deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STM que, ao negar provimento à apelação da defesa, determinara a expedição de mandado de prisão contra o paciente, apesar de pendente recurso de natureza extraordinária. Considerou-se inexistir, em face da Constituição, possibilidade de execução de sentença penal condenatória sem o seu trânsito em julgado. Asseverou-se que a execução provisória de sentença recorrível seria incompatível não apenas com o princípio da não-culpabilidade. Ter-se-ia, efetivamente, a inadmissibilidade de se executar qualquer sentença privativa de liberdade antes que ela esteja definitivamente consolidada. Ademais, entendeu-se que, proferida a sentença penal condenatória, nada obsta a decretação de custódia do réu, desde que demonstrada a cautelaridade (CPP, art. 312). Vencido o Min. Joaquim Barbosa, relator, que, tendo em conta que o tema fora afetado ao Plenário (HC 84078/MG, v. Informativos 367 e 371), denegava a ordem para aplicar a orientação ainda majoritária da Corte, no sentido de que os recursos excepcionais não suspendem a execução da pena privativa de liberdade. HC deferido para determinar a soltura do paciente, se por outro motivo não estiver preso.