Falsificação de lei por prefeito e dosimetria da pena

STF
832
Direito Penal
Direito Processual Penal
Geral
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Atualizado em 14 de novembro de 2025

Este julgado integra o

Informativo STF 832

Comentário Damásio

Resumo

A materialidade dos delitos devem estar devidamente demonstrada no processo.

Conteúdo Completo

A materialidade dos delitos devem estar devidamente demonstrada no processo.

A Primeira Turma, por maioria, deu parcial provimento a apelação somente para reajustar a dosimetria da pena aplicada em sentença que condenara parlamentar federal, prefeito municipal à época dos fatos, pela suposta prática dos crimes previstos no art. 297, §1º, do CP (“Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro: Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa. § 1º - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte”), e no art. 89 da Lei 8.666/1993 [“Art. 89.  Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa”]. No caso, o apelante teria alterado documento público verdadeiro, qual seja, o conteúdo de lei municipal, para incluir artigo inexistente. Ademais, teria dispensado licitação fora das hipóteses previstas em lei, tendo contratado empresa de engenharia mediante dispensa de licitação justificada por “estado de emergência” também inexistente. Foram, então, aplicadas as penas de 5 anos e 10 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, para o delito do art. 297, §1º, do CP, e de 3 anos de detenção, em regime inicial aberto, para o crime do art. 89 da Lei 8.666/1993, em concurso material. Dessa decisão fora interposta apelação, posteriormente remetida ao STF em razão da diplomação do apelante como deputado federal. Inicialmente, a Turma rejeitou preliminares suscitadas que tinham como fundamento alegada inépcia da denúncia e nulidade da sentença condenatória, esta última por violação ao art. 399, § 2º, do CPP (“O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença”). Destacou que, na espécie, a acusação teria se desincumbido de seu ônus de descrever, com a minúcia necessária, os fatos imputados ao acusado. A denúncia oferecida conteria, com clareza, a exposição dos fatos supostamente criminosos, a classificação dos crimes e a individualização da conduta, como preconizado no art. 41 do CPP. Outrossim, não se verificaria a suposta nulidade da sentença condenatória. A magistrada que presidira alguns dos atos de instrução por delegação de tribunal estadual o fizera em cumprimento de carta de ordem expedida para a comarca em que atuava. Sendo assim, uma vez que houvera a limitação unicamente à instrução de parte do feito por delegação de tribunal de justiça, não se poderia pretender que estivesse a juíza de primeira instância vinculada aos autos para prolação de sentença.
No mérito, o Colegiado afirmou que a materialidade dos delitos em questão estaria devidamente demonstrada no processo. De fato, da análise da lei original aprovada pela câmara dos vereadores constatar-se-ia que na lei falsificada fora inserido dispositivo legal não aprovado por aquela casa legislativa. Haveria laudo pericial a demonstrar que o texto enviado à publicação teria contado com artigo anteriormente inexistente no projeto de lei encaminhado pela prefeitura para a câmara dos vereadores. Da mesma forma, a materialidade do crime preconizado no art. 89 da Lei 8.666/1993 encontrar-se-ia comprovada em documentos acostados aos autos. A Turma afirmou também que a autoria de ambos os delitos seria inconteste e recairia, indubitavelmente, sobre o apelante, que, na qualidade de prefeito, teria decretado estado de emergência na cidade e autorizado a contratação direta de empresa para a conclusão de obra, dispensando a realização de procedimento licitatório. Teria igualmente assinado a referida lei com conteúdo adulterado, estando demonstrada a ciência inequívoca do ilícito. Relativamente à dosimetria da pena imposta, contudo, a Turma destacou que a qualidade de prefeito municipal do apelante teria sido duplamente considerada, o que configuraria “bis in idem”. Como a regra do art. 297, § 1º, do CP, estabelece que a pena deve ser aumentada de um sexto quando o agente for funcionário público e cometer o crime prevalecendo-se do cargo, essa circunstância deveria ser considerada apenas por ocasião da majorante, na terceira fase da dosimetria e não na primeira fase. Sendo assim, a pena base deveria ser reduzida para 3 anos e 6 meses de reclusão, quantidade de pena um pouco acima do mínimo, mas ainda abaixo do termo médio, o que estaria justificado principalmente diante da culpabilidade extremamente acentuada consistente na falsificação de uma lei. Com o aumento de um sexto, tal qual determinado pelo o art. 297, § 1º, do CP, e não havendo outras majorantes nem circunstâncias legais a serem sopesadas, a pena definitiva deveria ficar em 4 anos e 2 meses de reclusão. Vencido o Ministro Marco Aurélio, que mantinha a sentença proferida originalmente.

Legislação Aplicável

CP, art. 297, § 1º.
CPP, arts. 41; 399, § 2º.
Lei 8.666/1993, art. 89.

Informações Gerais

Número do Processo

971

Tribunal

STF

Data de Julgamento

28/06/2016