Competência da Justiça do Trabalho em demandas de celetistas pré-1988 sem concurso, com contratação temporária
Na origem, trata-se de Reclamação Trabalhista ajuizada, em 20/10/2020, contra o Município, na qual a parte autora narrou que fora admitida em 23/01/86, sob o regime da CLT, sem concurso público. Foi dispensada, sem justa causa, em 31/03/2020, e recontratada no dia seguinte, em 01/04/2020, para a mesma função, com alteração de regime jurídico, na modalidade de prestação temporária de trabalho. Informou que continuou a exercer o mesmo trabalho, a partir de 01/04/2020, mas com grande redução salarial, e que, "apesar da dispensa sem justa causa, o Município réu não realizou as devidas anotações de baixa na CTPS do Reclamante, assim como também não realizou nenhum pagamento de verbas rescisórias, tampouco recolheu o FGTS do Autor". Requereu o pagamento de verbas rescisórias trabalhistas, até 31/03/2020, sob regime da CLT, por entender configurada a rescisão indireta do contrato de trabalho, bem como o pagamento de diferenças salariais, a partir de abril de 2020, com a declaração de nulidade do contrato de prestação temporária de serviço, por prazo determinado e o pagamento de indenização por dano moral, em decorrência da redução remuneratória, a partir de 01/04/2020. Cinge-se a controvérsia a definir a competência para processar e julgar esta demanda. Sobre o tema, o STF definiu, em sede de repercussão geral, "ser da competência da Justiça do Trabalho processar e julgar demandas visando a obter prestações de natureza trabalhista, ajuizadas contra órgãos da Administração Pública por servidores que ingressaram em seus quadros, sem concurso público, antes do advento da CF/88, sob regime da Consolidação das Leis do Trabalho -CLT. Inaplicabilidade, em casos tais, dos precedentes formados na ADI 3.395-MC (Rel. Min. Cezar Peluso, DJ de 10/11/2006) e no RE 573.202 (Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Dje de 5/12/2008, Tema 43)". Consubstanciando essa orientação, a Súmula 97/STJ estabelece que "compete à Justiça do Trabalho processar e julgar reclamação de servidor público relativamente a vantagens trabalhistas anteriores à instituição do regime jurídico único". Acresça-se que, no caso, a competência da Justiça do Trabalho - na qual ajuizada a Reclamação - não se descaracteriza pelo fato de a parte reclamante ter adicionado, aos pedidos relativos ao vínculo trabalhista - pagamento de aviso prévio, FGTS, liberação das guias do seguro-desemprego, multa do art. 477, § 8º, da CLT, indenização de férias, 13º salário, adicional de insalubridade e indenização por danos morais -, requerimento de pagamento de diferenças salariais dos meses de abril a outubro de 2020, quando já estava sob o regime de contratação temporária, bem como a declaração de nulidade de contrato de prestação temporária de serviço, a partir de 01/04/2020. No caso de pedidos cumulados, incide a Súmula n. 97 desta Corte Superior conjugada com a orientação firmada na Súmula nº 170, também deste Superior Tribunal de Justiça, que dispõe que compete ao juízo onde primeiro for intentada a ação envolvendo acumulação de pedidos, trabalhista e estatutário, decidi-la nos limites da sua jurisdição, sem prejuízo do ajuizamento de nova causa, com o pedido remanescente, no juízo próprio.
Liberdade de imprensa em críticas a atos oficiais e agentes públicos sem violar intimidade
Esta Corte Superior estabeleceu, para situações de conflito entre a liberdade de expressão e os direitos da personalidade, entre outros, os seguintes elementos de ponderação: "(I) o compromisso ético com a informação verossímil; (II) a preservação dos chamados direitos da personalidade, entre os quais incluem-se os direitos à honra, à imagem, à privacidade e à intimidade; e (III) a vedação de veiculação de crítica jornalística com intuito de difamar, injuriar ou caluniar a pessoa (animus injuriandi vel diffamandi)" (REsp 801.109/DF, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe de 12/03/2013). Em princípio, a publicação de matéria jornalística que narra fatos verídicos ou verossímeis não caracteriza hipótese de responsabilidade civil, ainda que apresentando opiniões severas, irônicas ou impiedosas, sobretudo quando se tratar de figura pública que exerça atividade tipicamente estatal, gerindo interesses da coletividade, e que se refira a fatos de interesse geral relacionados à atividade pública desenvolvida pela pessoa noticiada. A liberdade de expressão, nessas hipóteses, é prevalente, atraindo verdadeira excludente anímica, a afastar o intuito doloso de ofender a honra da pessoa a que se refere a reportagem. Contudo, a análise acerca da ocorrência de abuso no exercício da liberdade de expressão, a ensejar reparação por dano moral, deve ser feita em cada caso concreto, mormente quando a pessoa envolvida for investida de autoridade pública, pois, em tese, sopesados os valores em conflito, é recomendável que se dê primazia à liberdade de informação e de crítica, como decorrência da vida em um Estado Democrático. Em observância à situação fática do processo em epígrafe, a reportagem baseou-se em relatos do superintendente da Polícia Civil do Estado, acerca da deflagração de operação que investigava pessoas envolvidas com o jogo do bicho em determinado Estado, citando a atuação da autora no exercício de seu cargo público (magistrada), tendo o Tribunal local consignado expressamente que "a intenção de narrar o ocorrido esteve presente durante toda a redação do texto". Nesse prisma, tem-se que a matéria jornalística relacionou-se a fatos de interesse da coletividade, os quais dizem respeito diretamente com atos da magistrada enquanto autoridade pública. Assim, verifica-se que, em que pese o tom ácido da referida reportagem, com o emprego de expressões como "aberração jurídica" e "descalabro", as críticas estão inseridas no âmbito da matéria jornalística de cunho informativo, baseada em levantamentos de fatos de interesse público, sem adentrar a intimidade e a vida privada da recorrida, o que significa que não extrapola claramente o direito de crítica, principalmente porque exercida em relação a caso que ostenta gravidade e ampla repercussão e interesse social. Desse modo, quando não ficar caracterizado o abuso ofensivo na crítica exercida pela parte no exercício da liberdade de expressão jornalística, deve-se afastar o dever de indenização, por força da "imperiosa cláusula de modicidade" subjacente a que alude a eg. Suprema Corte no julgamento da ADPF 130/DF.