ICMS integra a indenização por rescisão imotivada na representação comercial
A controvérsia reside em verificar se o ICMS integra a base de cálculo da indenização devida ao representante comercial pela rescisão sem justa causa do contrato. O título que transitou em julgado é claro, não só em aplicar, analogicamente, a Lei n. 4.886/1965, que cuida do contrato de representação, como também é expresso em consignar que o montante indenizatório corresponde a percentual do faturamento total auferido pela ora recorrente, nos dois últimos anos de vigência do contrato, deixando ainda assente que o cálculo é informado pelos parâmetros do art. 27, j, daquele diploma legal, sem fazer qualquer ressalva a respeito da exclusão do ICMS da base de cálculo. Não se deve confundir o "faturamento" referente à questão tributária com a matéria aqui discutida, é dizer, a aplicação, por analogia, do regramento legal que trata do contrato de representação, a Lei n. 4.886/1965. A esse respeito, o norte adotado pelo STJ é no sentido de que a comissão a que tem o representante direito, pela venda de mercadorias adquiridas da representada, é calculada sobre o valor total daqueles bens, sem desconto de impostos. Se a indenização a que tem direito o representante comercial é calculada sobre o valor total das mercadorias, sem descontos de impostos e encargos financeiros, de igual modo será calculado o montante indenizatório pelo rompimento do contrato, na hipótese de distribuição de bebidas, pois a decisão transitada em julgado estabeleceu como parâmetro "o valor do faturamento de seus últimos exercícios fiscais anteriores à rescisão, aplicando-se o art. 27 da Lei n. 4.886/65". Isto significa que o valor do faturamento dos dois últimos exercícios fiscais anteriores à rescisão, sem redução da parcela do ICMS, é o devido, pois, aplicando-se o art. 27, j, da Lei n. 4.886/1965, corresponderá à indenização que seria devida a um representante comercial pela rescisão do contrato fora dos casos previstos no art. 35, ou seja, sem justa causa, tendo como base de cálculo, para incidência do percentual de 1/12 (um doze avos) previsto na norma legal, o total da retribuição auferida durante o tempo em que exerceu a representação. Entender de outra maneira, seria violar a coisa julgada que se formou na espécie, até porque, in casu, é a melhor interpretação do título executivo judicial e que dá sentido e alcance ao dispositivo do julgado, observados os limites da lide, em conformidade com o pedido formulado no processo (AgInt no REsp 1.432.268/MG, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe de 29/3/2019).
Efeitos do ANPP no requisito de bom comportamento para reabilitação criminal
A controvérsia cinge-se a definir se o indiciamento seguido por um acordo de não persecução penal impede o deferimento do pedido de reabilitação criminal. A reabilitação é uma medida no âmbito da política criminal que pretende a restauração da dignidade pessoal de indivíduos condenados, bem como a facilitação de sua reintegração na comunidade. É um instrumento essencial para a ressocialização e a reinserção de condenados na sociedade, uma vez que reconhece que, em certos casos, as pessoas podem demonstrar que estão prontas para reassumir plenamente seus direitos e responsabilidades como cidadãos. Para isso o legislador prescreveu alguns requisitos para sua obtenção, previstos no art. 94, I, II e III, do CP. Entre esses requisitos, depreende-se que é necessário que o condenado demonstre, ao longo desse tempo, um comportamento público e privado que denote uma efetiva e constante boa conduta. No tocante à questão de o indiciamento seguido por um acordo de não persecução penal não ser considerado como antecedente criminal desfavorável, é crucial estabelecer uma distinção entre antecedentes criminais desfavoráveis e a demonstração efetiva e constante de bom comportamento público e privado ao longo de um período de 2 (dois) anos contados a partir da data de extinção, de qualquer forma, da pena ou do término de sua execução, para fins de reabilitação. O art. 28-A, §12, do Código de Processo Penal estabelece que a celebração e o cumprimento do ANPP não serão registrados na certidão de antecedentes criminais. Assim, a celebração do acordo não implicará o registro de reincidência no histórico criminal do indivíduo. Noutro vértice, o termo "bom comportamento público e privado", constante no art. 94, II, do CPP, refere-se à conduta social e moral de um indivíduo, tanto em suas interações públicas quanto privadas. Ele engloba ações éticas, respeitosas e socialmente aceitáveis em todas as áreas da vida, independentemente de estar em um ambiente público, onde outras pessoas estão presentes, ou em situações privadas, mais íntimas e pessoais. Dito isso, constata-se que o fato de o acordo de não persecução penal não gerar reincidência ou maus antecedentes não necessariamente implica o reconhecimento de "bom comportamento público e privado", conforme estabelecido no art. 94, II, do CP, que se refere à conduta social e moral do indivíduo na sociedade. No caso, apesar dos efeitos do ANPP decorrentes de suposto crime previsto no art. 171, §3º, do CP pelo recebimento indevido do benefício de auxílio emergencial, a avaliação do "bom comportamento" deve ser feita com base nas ações cotidianas do indivíduo. Logo, a ausência de bom comportamento devido ao seu indiciamento pelo crime de estelionato majorado por fraude eletrônica pode ser considerada como justificativa para negar o pedido de reabilitação.
Nulidade do Júri por negar diligência do Ministério Público para localizar testemunha imprescindível
O art. 461, caput, do CPP, dispõe que: "O julgamento não será adiado se a testemunha deixar de comparecer, salvo se uma das partes tiver requerido a sua intimação por mandado, na oportunidade de que trata o art. 422 deste Código, declarando não prescindir do depoimento e indicando a sua localização." Vê-se que o regramento se refere a ambas as partes, dispondo pelo adiamento em todos os casos onde não tenha sido localizada a testemunha imprescindível. A indicação de testemunha deste porte pressupõe que sua oitiva é importante, notadamente em plenário, quando os elementos probatórios são construídos por um juiz leigo. Caso em que a supressão de informações essenciais ao corpo de jurados enseja grave violação do princípio da soberania dos veredictos. Mister também é a notificação em tempo hábil do conteúdo das certidões negativas dos oficiais de Justiça, de modo a oportunizar às partes a atualização do endereço da testemunha não localizada. Destarte, diante da informação tardia da negativa de intimação pessoal da testemunha imprescindível, além da nulidade de julgamento da sessão plenária ter sido suscitada na primeira oportunidade pelo Parquet - logo depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes, nos termos do art. 571, V, do CPP, o pedido de adiamento deveria ter sido acolhido pelo magistrado. "Em uma leitura a contrario sensu do art. 461 do CPP, a sessão plenária será adiada se a testemunha arrolada em caráter de imprescindibilidade não comparecer. O fato de a defesa haver sido informada, somente no dia do julgamento, que as testemunhas arroladas não foram encontradas viola o referido dispositivo legal" (AgRg no RHC 130.259/PR, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 4/5/2023). De fato, ao mitigar o exercício da atividade acusatória, houve ofensa ao principio do contraditório e, por conseguinte, prejuízo ao Parquet, ao qual se viu impedido do direito de tomar o depoimento de testemunha considerada imprescindível ao deslinde do feito, tendo sido cientificado da sua não localização somente em plenário, momento em que requereu adiamento do julgamento e prazo para diligenciar o endereço atualizado, o que lhe foi negado de modo desarrazoado.
Legitimidade de pessoas jurídicas privadas para pedido de suspensão de liminar em serviço público
A controvérsia consiste em analisar se a decisão cuja suspensão dos efeitos se pleiteia, por interferir na composição acionária da empresa, implica vencimento antecipado dos valores já liberados em contrato de financiamento firmado com a Caixa Econômica Federal, o que, de forma reflexa, comprometeria a continuidade dos serviços públicos de saneamento básico, além de causar grave lesão à ordem e à economia públicas. No caso, conquanto da companhia de abastecimento ser concessionária de serviço público, não restou efetivamente comprovado, de forma inequívoca, que a pretensão deduzida visa, efetivamente, à tutela do interesse público primário - assim entendido como a própria subsistência da prestação do serviço público, sujeito ao princípio da continuidade. Com efeito, a decisão cujos efeitos se pretende suspender foi proferida em demanda de natureza privada na qual a empresa de saneamento discute com a única acionista da Sociedade Anônima constituída com o fim específico de participar de certame relativo a serviço de abastecimento de água e esgoto do Município, cláusulas contratuais referentes à participação da empresa de saneamento na sociedade. Todavia, não se pode concluir que esse provimento poderá inviabilizar o financiamento do contrato de concessão, especialmente ocasionando vencimento antecipado de saldo devedor de contrato de financiamento ou cessação de repasses pelo financiador, a Caixa Econômica Federal. A concessionária, portanto, pretende obter a salvaguarda de possibilidade abstrata, que, se necessário, pode e deve ser debatida em ação própria, com figurantes divergentes dos que constam da ação de origem. Nesse sentido, a admissão de acontecimentos incertos e casuais genericamente afirmados como fundamento para a concessão de SLS implicaria o acolhimento de toda e qualquer justificativa trazida pelas partes como motivo para Suspensão de Liminar e de Sentença ou de Suspensão de Segurança. Desse modo, não se configura a legitimidade extraordinária da concessionária, porquanto o pedido não diz respeito direta e imediatamente ao serviço público concedido.
Comparecimento da vítima à delegacia não equivale a representação penal
A jurisprudência da Terceira Seção desta Corte, na esteira da orientação sedimentada no âmbito do STF, firmou o entendimento de que a representação - nos crimes de ação penal pública condicionada -, prescinde de maiores formalidades, sendo suficiente a demonstração inequívoca de que a vítima tem interesse na persecução penal. Enquanto condição de procedibilidade para a ação penal pública condicionada, é certo que o comparecimento perante a autoridade policial só pode ser tomado como representação quando é espontâneo, tal como ocorre nos casos em que a vítima registra ocorrência policial ou mesmo comparece espontaneamente ao Instituto Médico Legal para fins de submissão ao respectivo exame médico legal. Em tais cenários, está implícita a vontade da vítima em dar início à persecução penal. Por outro lado, quando esse comparecimento não é espontâneo, ou seja, a vítima comparece em observância ao mandado de intimação previamente expedido pela autoridade policial, incumbe àquela autoridade colher a representação, ainda que circunstanciando esse fato no próprio termo de declaração. No caso, as vítimas só compareceram mediante intimação da autoridade policial, sendo que, nas declarações obtidas, não há manifestação expressa do desejo de representar, circunstâncias que obstam tomar o mero comparecimento como representação para fins penais.