Programa “Mais Médicos”: exigência de chamamento público para abertura de cursos de medicina

STF
1139
Direito Constitucional
Geral
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Atualizado em 14 de novembro de 2025

Este julgado integra o

Informativo STF 1139

Comentário Damásio

Resumo

É constitucional a política pública instituída pelo art. 3º da Lei nº 12.871/2013 (“Lei do Programa Mais Médicos”), que condiciona a autorização para o funcionamento de curso de graduação em medicina à prévia realização de chamamento público.

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É constitucional a política pública instituída pelo art. 3º da Lei nº 12.871/2013 (“Lei do Programa Mais Médicos”), que condiciona a autorização para o funcionamento de curso de graduação em medicina à prévia realização de chamamento público. 

A constatação de falta de médicos, agravada pela distribuição desigual no território nacional, ensejou política estatal que faculta a instalação de faculdades de medicina em regiões com reduzida oferta de médicos e serviços de saúde, vinculando a atuação econômica dos agentes privados à finalidade pública de melhoria dos equipamentos públicos do Sistema Único de Saúde (SUS). Nesse contexto, o dispositivo impugnado mostra-se adequado para o objetivo pretendido pelo Poder Público, inexistindo contrariedade ao subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito, bem como aos princípios da livre iniciativa, da isonomia e da livre concorrência. 

A política do chamamento público busca concretizar políticas públicas indutoras e restritivas, voltadas a ordenar e integrar a formação dos recursos humanos ao SUS sem impedir a livre iniciativa. Os agentes privados podem atuar no mercado, mas a instalação dos cursos está condicionada à necessidade social dos municípios, de modo que os recursos financeiros e institucionais sejam direcionados ao atendimento das demandas do SUS. 

Dessa forma, a sistemática do dispositivo impugnado é incompatível com a abertura de novos cursos de medicina nos moldes da Lei nº 10.861/2004 e com a autorização de novas vagas em cursos já existentes, pois é imprescindível o prévio chamamento público e a devida observância aos requisitos previstos na Lei nº 12.871/2013. Por outro lado, fica ressalvada a possibilidade de a sociedade civil pleitear o lançamento de editais para instalação de novos cursos em determinadas localidades, cabendo à Administração Pública responder aos pleitos com a devida fundamentação, publicidade e em prazo razoável. 

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, em apreciação conjunta, converteu o referendo de medida cautelar proposta no bojo da ADC 81/DF em julgamento de mérito e julgou parcialmente procedentes as ações para assentar a constitucionalidade do art. 3º da Lei nº 12.871/2013 (1). Ademais, com relação aos processos administrativos e judiciais que tratam do tema objeto destas ações, o Tribunal determinou que: (i) sejam mantidos os novos cursos de medicina instalados — ou seja, contemplados por Portaria de Autorização do Ministério da Educação — por força de decisões judiciais que dispensaram o chamamento público e impuseram a análise do procedimento de abertura do curso de medicina ou de ampliação das vagas em cursos existentes nos termos da Lei nº 10.861/2004; (ii) tenham seguimento os processos administrativos pendentes, previstos na Lei nº 10.861/2004, instaurados por força de decisão judicial, que ultrapassaram a fase inicial de análise documental a que se referem os arts. 19, § 1º, e 42, ambos do Decreto nº 9.235/2017, a depender de tratar-se de credenciamento de nova instituição de ensino ou de autorização de novo curso, devendo as diversas instâncias técnicas convocadas a se pronunciar, nas etapas seguintes do processo de credenciamento/autorização, observar se o município e o novo curso de medicina atendem integralmente aos critérios previstos nos §§ 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei nº 12.871/2013; e (iii) sejam extintos os processos administrativos que não ultrapassaram a etapa prevista no art. 19, § 1º, ou no art. 42 do Decreto nº 9.235/2017, nos termos do art. 52 da Lei nº 9.784/1999. 

 

(1) Lei nº 12.871/2013: “Art. 3º A autorização para o funcionamento de curso de graduação em Medicina, por instituição de educação superior privada, será precedida de chamamento público, e caberá ao Ministro de Estado da Educação dispor sobre: I - pré-seleção dos Municípios para a autorização de funcionamento de cursos de Medicina, ouvido o Ministério da Saúde; II - procedimentos para a celebração do termo de adesão ao chamamento público pelos gestores locais do SUS; III - critérios para a autorização de funcionamento de instituição de educação superior privada especializada em cursos na área de saúde; IV - critérios do edital de seleção de propostas para obtenção de autorização de funcionamento de curso de Medicina; e V - periodicidade e metodologia dos procedimentos avaliatórios necessários ao acompanhamento e monitoramento da execução da proposta vencedora do chamamento público. § 1º Na pré-seleção dos Municípios de que trata o inciso I do caput deste artigo, deverão ser consideradas, no âmbito da região de saúde: I - a relevância e a necessidade social da oferta de curso de Medicina; e II - a existência, nas redes de atenção à saúde do SUS, de equipamentos públicos adequados e suficientes para a oferta do curso de Medicina, incluindo, no mínimo, os seguintes serviços, ações e programas: a) atenção básica; b) urgência e emergência; c) atenção psicossocial; d) atenção ambulatorial especializada e hospitalar; e e) vigilância em saúde. § 2º Por meio do termo de adesão de que trata o inciso II do caput deste artigo, o gestor local do SUS compromete-se a oferecer à instituição de educação superior vencedora do chamamento público, mediante contrapartida a ser disciplinada por ato do Ministro de Estado da Educação, a estrutura de serviços, ações e programas de saúde necessários para a implantação e para o funcionamento do curso de graduação em Medicina. § 3º O edital previsto no inciso IV do caput deste artigo observará, no que couber, a legislação sobre licitações e contratos administrativos e exigirá garantia de proposta do participante e multa por inexecução total ou parcial do contrato, conforme previsto, respectivamente, no¿art. 56¿e no¿inciso II do caput do art. 87 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. § 4º O disposto neste artigo não se aplica aos pedidos de autorização para funcionamento de curso de Medicina protocolados no Ministério da Educação até a data de publicação desta Lei. § 5º O Ministério da Educação, sem prejuízo do atendimento aos requisitos previstos no inciso II do § 1º deste artigo, disporá sobre o processo de autorização de cursos de Medicina em unidades hospitalares que: I - possuam certificação como hospitais de ensino; II - possuam residência médica em no mínimo 10 (dez) especialidades; ou III - mantenham processo permanente de avaliação e certificação da qualidade de seus serviços. § 6º O Ministério da Educação, conforme regulamentação própria, poderá aplicar o procedimento de chamamento público de que trata este artigo aos outros cursos de graduação na área de saúde. § 7º A autorização e a renovação de autorização para funcionamento de cursos de graduação em Medicina deverão considerar, sem prejuízo de outras exigências estabelecidas no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes): I - os seguintes critérios de qualidade: a) exigência de infraestrutura adequada, incluindo bibliotecas, laboratórios, ambulatórios, salas de aula dotadas de recursos didático-pedagógicos e técnicos especializados, equipamentos especiais e de informática e outras instalações indispensáveis à formação dos estudantes de Medicina; b) acesso a serviços de saúde, clínicas ou hospitais com as especialidades básicas indispensáveis à formação dos alunos; c) possuir metas para corpo docente em regime de tempo integral e para corpo docente com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado; d) possuir corpo docente e técnico com capacidade para desenvolver pesquisa de boa qualidade, nas áreas curriculares em questão, aferida por publicações científicas; II - a necessidade social do curso para a cidade e para a região em que se localiza, demonstrada por indicadores demográficos, sociais, econômicos e concernentes à oferta de serviços de saúde, incluindo dados relativos à: a) relação número de habitantes por número de profissionais no Município em que é ministrado o curso e nos Municípios de seu entorno; b) descrição da rede de cursos análogos de nível superior, públicos e privados, de serviços de saúde, ambulatoriais e hospitalares e de programas de residência em funcionamento na região; c) inserção do curso em programa de extensão que atenda a população carente da cidade e da região em que a instituição se localiza.”

Legislação Aplicável

Lei nº 9.784/1999: art. 52
Lei nº 10.861/2004
Lei nº 12.871/2013: art. 3º
Decreto nº 9.235/2017: art. 19, § 1º, e art. 42

Informações Gerais

Número do Processo

7187

Tribunal

STF

Data de Julgamento

04/06/2024