Uso de marca concorrente como palavra-chave em links patrocinados configura concorrência desleal

STJ
747
Direito Empresarial
Geral
2 min de leitura
Atualizado em 25 de novembro de 2025

Este julgado integra o

Informativo STJ 747

Tese Jurídica

Configura concorrência desleal a contratação de serviços de links patrocinados ( keyword advertising) prestados por provedores de busca na internet para obter posição privilegiada em resultado de busca em que o consumidor de produto ou serviço utiliza como palavra-chave a marca de um concorrente.

Comentário Damásio

Resumo

A controvérsia consiste em definir se configura ou não concorrência desleal a conduta de um anunciante na internet de utilizar a marca registrada de um concorrente como palavra-chave em link patrocinado para obter posição privilegiada em resultados de buscas, direcionando os usuários daqueles produtos e serviços para o seu próprio sítio eletrônico. Sendo a livre iniciativa e a livre concorrência fundamentos de nosso ordenamento, a efetivação do objetivo que subsidiam impõe, por certo, a disciplina de um regramento mínimo. Nesse rumo, a normatização favorece disputas leais de mercado, ao mesmo tempo em que censura práticas ilegítimas de obtenção de vantagem, estrutural ao direito concorrencial. É desleal a concorrência sempre que se verificar a utilização de esforços que se distanciam da ética e perseguem o desvio de clientela e empobrecimento do concorrente. Em recurso julgado pelo rito dos repetitivos (REsp 1.527.232/SP), ficou acentuado que, baseado na definição de concorrência desleal apresentada na Convenção da União de Paris (alínea 2 do seu artigo 10 bis), observa-se que a noção de concorrência pode variar de um país para outro, já que o entendimento sobre o que seja "uso honesto", em matéria industrial e comercial, é variável e estabelece-se conforme o espaço e tempo que ocupa, moldando-se em práticas moralmente aceitas e sobre valores, realidade social e conjunto de princípios do regime jurídico a que será aplicável. A Lei de Propriedade Industrial (Lei n. 9.279/1996), especialmente em seu art. 195, tipifica como crime de concorrência desleal nas hipóteses em que se: "III - emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem; IV - usa expressão ou sinal de propaganda alheios, ou os imita, de modo a criar confusão entre os produtos ou estabelecimentos; V - usa, indevidamente, nome comercial, título de estabelecimento ou insígnia alheios ou vende, expõe ou oferece à venda ou tem em estoque produto com essas referências". O exame da matéria em julgamento passa por contextualizar o tema no ambiente virtual, principalmente no âmbito da internet. Com efeito, o desenvolvimento tecnológico concebeu situações até então desconsideradas pelo ordenamento jurídico, mas que demandariam tutela jurídica. De acordo com a doutrina, "o fato de a Internet ter se transformado numa 'grande ferramenta de publicidade, senão a maior, para o fomento da produção e circulação de bens ou serviços", "a invisibilidade é equivalente à morte". No contexto dos recursos tecnológicos, a Internet se destaca como instrumento arrojado de interação eficiente, tendo em vista a expedita propagação da informação, num ininterrupto trânsito de dados. Assim, as relações arquitetadas no "sistema global de redes de computadores", transações econômicas ou sociais, por organizações e instituições ou individuais, ajustam-se, majoritariamente, pela produção, registro, gerenciamento e uso de informação, multiplicando-se as formas de produção e circulação de produtos e serviços, transformando os modelos de negócio até então existentes. Nessa senda, mister assinalar que é comum o reconhecimento de que a neutralidade da rede estimula a livre concorrência e o acesso do consumidor aos bens e serviços. Em outra perspectiva, a Internet maximiza a visibilidade da oferta e circulação de produtos e serviços, propiciando aos players o alcance de mercados até então de difícil ou impossível ingresso. Em virtude da evolução da internet , o comércio eletrônico ( e-commerce ), atividade de alienação, em sentido amplo, de bens ou serviços por meio eletrônico, apresenta-se como forma interessante de desenvolvimento da atividade empresarial, propiciando o advento de novos modelos de negócio e a expansão da livre concorrência. Nesse rumo, ao mesmo tempo em que a concorrência é favorecida, impõe-se a cada um dos atuantes do mercado empenho maior para que se destaque dos demais. Assim, para suprir essa demanda, novos expedientes de visibilidade são desenvolvidos e oferecidos pelos provedores de pesquisa da Internet. Com efeito, as empresas que atuam no e-commerce preocupam-se com o formato e funcionalidade de seus endereços virtuais e, cada vez mais, empregam esforços para que seus sites apareçam em posição de destaque nos resultados das buscas na Internet . Agem desta maneira visando atrair o maior número possível de visitantes, potenciais clientes. Por certo, o principal instrumento utilizado pelo comércio eletrônico é oferecido pelos provedores de pesquisa, sites que rastreiam, indexam e armazenam as mais variadas informações disponíveis online , organizando-as e classificando-as para que, uma vez consultados, possam fornecê-las através de sugestões (ou resultados) que atendam aos critérios de busca informados pelos próprios usuários, um serviço pago de publicidade para alterar o referenciamento de um domínio, com base na utilização de certas palavras-chave. Dizendo de outro modo, o provedor coloca à venda palavras-chave, que quando utilizadas pelo usuário, acarretarão o aparecimento, com destaque e precedência, do conteúdo pretendido pelo anunciante. A esse mecanismo oferecido pelos provedores de busca para dar publicidade aos produtos e serviços dá-se o nome de links patrocinados ( keyword advertising ). Assim, terão prevalência no rol de resultados de determinada busca, o anúncio, empresa ou marca daquele anunciante que se dispôs a pagar o maior valor pela posição destacada da palavra-chave. Embora seja lícito o expediente dos links patrocinados nos sites de busca, a inexistência de parâmetros ou mesmo proibições referentes às palavras-chaves que acionem a publicidade, escolhidas pelos anunciantes, podem gerar conflitos relacionados à propriedade intelectual. É que algumas empresas, ao contratarem links patrocinados, elegem como tal marcas ou nomes empresariais de concorrentes, usualmente empresas consagradas em seus respectivos ramos de atuação. Diante deste cenário, a utilização, por terceiros, de marcas registradas, como palavras-chave em links patrocinados, com indiscutível desvio de clientela, caracteriza ato de concorrência desleal. A utilização da marca de um concorrente como palavra-chave para direcionar o consumidor do produto ou serviço para o link do concorrente usurpador, é capaz de causar confusão quanto aos produtos oferecidos ou a atividade exercida pelos concorrentes. A deslealdade, aqui, estaria na forma de captação de clientela, por recurso ardil, sem a dispensa de investimentos condizentes. Ainda, a prática desleal conduz a processo de diluição da marca no mercado, que perde posição de destaque e prejuízo à função publicitária, pela redução da visibilidade. Além da flagrante utilização indevida de nome empresarial e marca alheia, a utilização de links patrocinados, na forma como engendrada pela ora recorrente, é conduta reprimida pelo art. 195, III e V, da Lei da Propriedade Industrial e pelo artigo 10 bis, da Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial. A propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em toda a abrangência do território nacional, conforme dispõe o art. 129 da Lei n. 9.279/1996, sendo certo que "abrange o uso da marca em papéis, impressos, propaganda e documentos relativos à atividade do titular", também nos termos do art. 131 da mesma lei. Nesse rumo de ideias, é certo que o estímulo à livre iniciativa, dentro ou fora da rede mundial de computadores, deve conhecer limites, sendo inconcebível reconhecer lícita conduta que cause confusão ou associação proposital à marca de terceiro atuante no mesmo nicho de mercado.

Informações Gerais

Número do Processo

REsp 1.937.989-SP

Tribunal

STJ

Data de Julgamento

23/08/2022