Supremo Tribunal Federal • 7 julgados • 02 de dez. de 2004
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O Tribunal, por maioria, indeferiu cautelar em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB contra a Medida Provisória 225/2004, que autoriza a Caixa Econômica Federal, em caráter excepcional e por tempo determinado, a arrecadar e alienar em hasta pública os diamantes brutos em poder de indígenas. Entendeu-se carente de plausibilidade jurídica o pedido de suspensão da MP, visto que - consideradas as peculiaridades do caso, quais sejam, a lavra já consumada e a situação emergencial descrita na exposição de motivos da MP, consistente nos conflitos existentes na região decorrentes da comercialização ilegal das pedras - estariam preenchidos os pressupostos autorizadores da edição da norma, bem como não teria havido, a princípio, usurpação da competência exclusiva do Congresso Nacional para autorizar pesquisa e lavra de riquezas minerais de terras indígenas (CF, art. 49, XVI e 231, §3º). Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia a cautelar.
O Tribunal julgou procedente, em parte, pedido de ação direta proposta pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro contra o inciso II do §2º do art. 128 da Constituição fluminense, o art. 18 de seu ADCT, e outros dispositivos das Leis Complementares estaduais 62/90 e 106/2003, que tratam da atuação de membros do Ministério Público comum estadual junto ao Tribunal de Contas estadual. Considerando a jurisprudência firmada sobre a matéria, consubstanciada no Enunciado 653 da Súmula do STF ("No Tribunal de Contas estadual, composto por sete conselheiros, quatro devem ser escolhidos pela Assembléia Legislativa e três pelo Chefe do Poder Executivo estadual, cabendo a este indicar um dentre auditores e outro dentre membros do Ministério Público, e um terceiro à sua livre escolha."), bem como a imprescindibilidade de que uma das vagas existentes no Tribunal de Contas estadual deva ser, necessariamente, destinada a membro do Ministério Público especial, entendeu-se que as normas impugnadas, ao permitirem que membros do Ministério Público comum estadual integrassem a composição do Tribunal de Contas local em vaga que deveria ser destinada à integrante do Ministério Público especial junto à Corte de Contas, violaram os arts. 73, §2º, I (determina que a nomeação recaia sobre membro do Ministério Público junto ao Tribunal); 75 (dispõe que os estados-membros devem observar o modelo federal instituído, quanto à organização, composição e fiscalização dos respectivos Tribunais de Contas) e 130 ("Aos membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas aplicam-se as disposições desta seção pertinentes a direitos, vedações e forma de investidura."), todos da CF. Declarou-se, por conseguinte, a inconstitucionalidade art. 1º; do art. 3º e seu parágrafo único; do art. 4º; da expressão "dentre os Procuradores em exercício junto ao Tribunal de Contas", constante do parágrafo único do art. 5º; do inciso I do parágrafo único do art. 5º; e do art. 6º, todos da LC estadual 62/90, e da expressão "e a lista de que trata o art. 128, § 2º, II, da Constituição do Estado", constante do inciso V do caput do art. 9º; da alínea b do inciso III do art. 39; e da expressão "e ao Tribunal de Contas do Estado", constante do caput do art. 42, todos da LC estadual 106/2003. No que se refere ao art. 128, § 2º, II, da Constituição fluminense, na redação dada pela EC estadual 13/2000, e ao art. 18 de seu ADCT, na redação dada pela EC estadual 25/2002, o Tribunal deu interpretação conforme a Constituição, para, sem redução de texto, restringir-lhes a exegese, em ordem a que, afastada qualquer outra possibilidade interpretativa, seja fixado o entendimento de que o MP referido em tais normas é o MP especial com atuação exclusiva junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro.
O Tribunal concluiu julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente da República que, por decreto, ampliara os limites territoriais de estação ecológica no Estado do Rio Grande do Sul - v. Informativo 360. Concedeu-se, por maioria, a ordem por se entender imprescindível, para ampliação de estação ecológica, a existência da consulta pública a que alude o §2º do art. 22 da Lei 9.985/2000 (que regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII da CF e institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza). Salientou-se, ainda, a inaplicabilidade do §4º do referido art. 22, porquanto o mesmo dispensa a consulta pública somente no caso de criação de estação ecológica. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, relator, Eros Grau, Joaquim Barbosa e Ellen Gracie, que denegavam a segurança por considerarem extensível a regra do mencionado §4º à hipótese de ampliação. (Lei 9.985/2000: "Art. 22. ...§ 2º A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade, conforme se dispuser em regulamento. ... § 4º Na criação de Estação Ecológica ou Reserva Biológica não é obrigatória a consulta de que trata o § 2º deste artigo.").
O Tribunal julgou procedente pedido de ação cautelar para conferir efeito suspensivo a recurso extraordinário interposto contra acórdão do TSE e restabelecer sentença que cassara diploma de Prefeito por captação ilícita de sufrágio e que absolvera o Vice-Prefeito, requerente desta ação, da imputação de abuso de poder econômico. Na espécie, da sentença referida, apenas o Prefeito recorrera. Não obstante, o TRE reformara a decisão de 1º grau para cassar também o mandato do Vice-Prefeito, o que ensejara a interposição de recurso especial, sob a alegação de ofensa à coisa julgada, o qual fora improvido pelo TSE, por maioria, ao fundamento de que seria lícita a correção da questão atinente à matéria de ordem pública, qual seja, a subordinação jurídica do Vice-Prefeito ao que decidido em relação ao Prefeito, tendo em conta o efeito translativo do recurso ordinário. Preliminarmente, indeferiu-se, por ausência de interesse jurídico, o pedido de intervenção de terceiro, que alegava ter sido candidato da eleição anulada em que fora derrotada a chapa que encabeçara. No mérito, entendeu-se que a pronúncia do órgão recursal sobre a parcela não impugnada do capítulo decisório de sentença, ao transpor os limites do efeito devolutivo do recurso (CPC, art. 515, §1º), ofendeu a coisa julgada. Asseverou-se que o efeito translativo é apenas um dos subtipos do efeito devolutivo e que, salvo o caso de vício processual absoluto, que leve à anulação ou extinção do processo, sempre devolvido à cognição do Tribunal por conta daquele efeito, só serão conhecidas pelo Tribunal aquelas questões cuja solução serviu ou devia servir de fundamento dos capítulos decisórios impugnados pelo recurso, ou seja, o órgão recursal terá plena liberdade para análise das questões de fato e de direito debatidas na causa, inclusive as de ordem pública, desde que se restrinja aos limites da parcela impugnada do conteúdo decisório da sentença. Afastou-se, por fim, a possibilidade de o efeito do recurso do Prefeito alcançar o Vice-Prefeito, seu litisconsorte, com base no art. 509 do CPC, visto que a regra de extensão subjetiva do efeito devolutivo dos recursos só incide nos casos de litisconsórcio unitário.
O Tribunal concluiu julgamento de ação direta ajuizada pelo Partido dos Trabalhadores - PT contra a alínea e do inciso VIII do art. 46 da Constituição do Estado de Goiás, na redação dada pela EC 29/2001, que, ampliando as hipóteses de foro especial por prerrogativa de função, outorgou ao Tribunal de Justiça estadual competência para processar e julgar, originariamente, "os Delegados de Polícia, os Procuradores do Estado e da Assembléia Legislativa e os Defensores Públicos, ressalvadas as competências da Justiça Eleitoral e do Tribunal do Júri" - v. Informativos 340 e 370. Por maioria, acompanhando a divergência iniciada pelo Min. Carlos Britto, julgou-se procedente, em parte, o pedido, e declarou-se a inconstitucionalidade da expressão "e os Delegados de Polícia", contida no dispositivo impugnado. Entendeu-se que somente em relação aos Delegados de Polícia haveria incompatibilidade entre a prerrogativa de foro conferida e a efetividade de outras regras constitucionais, tendo em conta, principalmente, a que trata do controle externo da atividade policial exercido pelo Ministério Público. Considerou-se, também, nos termos dos fundamentos do voto do Min. Gilmar Mendes, a necessidade de se garantir a determinadas categorias de agentes públicos, como a dos advogados públicos, maior independência e capacidade para resistir a eventuais pressões políticas, e, ainda, o disposto no §1º do art. 125 da CF, que reservou às constituições estaduais a definição da competência dos respectivos tribunais. Vencidos, em parte, os Ministros Maurício Corrêa, relator, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso e Carlos Velloso que julgavam o pedido integralmente procedente, e Marco Aurélio e Celso de Mello que o julgavam integralmente improcedente.
A Turma deu provimento a recurso ordinário em mandado de segurança interposto contra acórdão do STJ que, não vislumbrando nulidade em processo administrativo, dado que o exame das questões ensejaria a análise de fatos e do mérito de ato administrativo, denegara mandado de segurança impetrado contra ato do Advogado-Geral da União e do Ministro de Estado dos Transportes que culminara na demissão do recorrente do cargo de engenheiro do quadro de pessoal do Departamento Nacional de Estradas e Rodagem - DNER, por improbidade administrativa e por valer-se do cargo para lograr proveito pessoal de outrem, em detrimento da dignidade da função pública (Lei 8.112/90, art. 117, IX e Lei 8.429/92, art. 11, caput, e I). Na espécie, a autoridade competente fundamentara o ato punitivo em preceito diverso do sugerido pela comissão processante (Lei 8.112//90, art. 117, XV e Lei 8.429/92, arts. 10, caput e 11, caput), nos autos de processo administrativo disciplinar instaurado para apurar a responsabilidade funcional do recorrente na utilização de índices e métodos supostamente incorretos, quando da elaboração de cálculos de atualização da dívida objeto de acordo extrajudicial que seria celebrado entre o DNER e determinada construtora. Inicialmente, assentou-se a possibilidade, e o dever, de o Poder Judiciário, mediante análise dos motivos do ato administrativo, rever a pena de demissão imposta a servidor público. Em seguida, afastou-se a penalidade aplicada ao servidor, com base na referida Lei 8.112/90, porquanto violado o seu direito de ampla defesa, eis que no procedimento administrativo fora discutido apnas o fato de ele ter agido ou não com desídia, sem ser abordada a questão de a empresa ter logrado proveito, motivo determinante de sua demissão. Considerou-se, ainda, inválido esse mesmo motivo, já que verificada a inexistência de proveito da empresa, em virtude da rescisão do acordo extrajudicial, sem o pagamento de qualquer quantia. Quanto à penalidade imposta com base na Lei 8.492/92, entendeu-se que, verificada a prática de atos de improbidade administrativa, caberia representação ao Ministério Público para ajuizamento da competente ação e não a demissão, haja vista que a aplicação das penalidades previstas nessa Lei não incumbe à Administração por ser privativa do Poder Judiciário. RMS provido para, reformando o acórdão proferido pelo STJ, cassar o ato mediante o qual imposta a penalidade de demissão ao recorrente e determinar sua imediata reintegração ao cargo.
A Turma indeferiu habeas corpus no qual se pretendia o trancamento da ação penal instaurada contra o paciente, advogado, pela suposta prática do crime de desacato contra magistrada cometido em audiência. Alegava-se, na espécie, ausência de justa causa para a ação penal, pois o paciente teria sido preso antes do cometimento do crime e sua conduta seria "decorrente da irresignação de estar sofrendo uma pena injustamente e ilegalmente". Invocava-se como fundamento a imunidade do advogado. Considerou-se que a deficiência da impetração, sequer acompanhada da denúncia, impedia a análise da alegação de constrangimento ilegal. Salientou-se, com base na jurisprudência da Corte, estar excluída da imunidade profissional do advogado a ofensa dirigida a magistrado, bem como não ser cabível, na via processual eleita, a verificação da existência ou não do dolo do paciente. Por fim, ressaltou-se que a expressão "ou desacato", contida no § 2º do art. 7º da Lei 8.906/94, teve sua eficácia suspensa na ADI 1127/DF (DJU de 29.6.2001). (Lei 8.906/94, art. 7º, § 2º: "O advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que cometer.").