Supremo Tribunal Federal • 6 julgados • 16 de mai. de 2019
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É constitucional o art. 38 da Lei 8.880, de 27 de maio de 1994, não importando a aplicação imediata desse dispositivo violação do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal (CF). É constitucional o art. 38 da Lei 8.880 (1), de 27 de maio de 1994, não importando a aplicação imediata desse dispositivo violação do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal (CF) (2). Com base nessa orientação, o Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) ajuizada em face desse dispositivo, que estabeleceu bases a serem seguidas para o cálculo dos índices de correção monetária. Preliminarmente, o colegiado, por maioria, conheceu da ADPF e reiterou o entendimento adotado no exame da medida cautelar. Assim, ao tratar do pressuposto específico, entendeu haver relevância jurídica e econômico-financeira da controvérsia constitucional, decorrente da divergência interpretativa a respeito do art. 38 da Lei 8.880/1994. No tocante aos pressupostos gerais, consignou que nela se discute acerca de possível violação de preceito fundamental relacionado à garantia do direito adquirido. O requisito da subsidiariedade está presente, visto que se questiona preceito de natureza eminentemente transitória, com efeitos exauridos no momento do ajuizamento da ação. É incabível outro instrumento de controle concentrado capaz de solver a controvérsia de forma ampla, geral e imediata (ADPF 33). Vencidos, no ponto, os ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, que não conheceram da ação. Segundo o ministro Marco Aurélio, existe outro meio jurídico eficaz para dirimir os conflitos de interesse, tanto que se implementou liminar para suspender os processos respectivos no território nacional. Ao acompanhá-lo, o ministro Ricardo Lewandowski salientou não vislumbrar com clareza a violação a preceito fundamental. No mérito, a Corte observou que a correção monetária visa recompor a perda do poder aquisitivo da moeda, em razão do ambiente inflacionário. Recordou que, quando da edição do preceito em debate, o Brasil vivia a experiência da inflação galopante. Para seu controle, surgiu o Plano Real. Na época, o plano para a implantação do real foi dividido, basicamente, em três etapas: i) estabelecimento, em bases permanentes, do equilíbrio das contas do governo; ii) criação da Unidade Real de Valor (URV); e iii) emissão da nova moeda. A Medida Provisória 434/1994 — que, após reedições, foi convertida na Lei 8.880/1994 — criou a URV, cujo valor, em 1º de março de 1994, seria aproximadamente o da cotação do dólar estadunidense naquele dia. Por ter a URV ficado com a exclusiva função de servir como padrão de valor monetário, o cruzeiro real, moeda física então circulante, manteve a função de servir como meio de pagamento dotado de poder liberatório. O quadro permaneceu assim até 1º de julho de 1994, quando o cruzeiro real deixou de integrar o sistema monetário nacional e a URV passou a ter poder liberatório e a ser denominada de real. Até que isso ocorresse, ficou a cargo do Banco Central do Brasil (Bacen) fixar a paridade diária entre o cruzeiro real e a URV, com base na perda do poder aquisitivo do cruzeiro real. Estabeleceu-se relação entre o dólar estadunidense, a URV e o cruzeiro real. Em função disso, a taxa de câmbio entre a moeda física circulante (cruzeiro real) e a estrangeira (dólar) foi guiada pela inflação. A taxa de conversão entre a moeda velha, o cruzeiro real, e a nova, a URV/real, teve valor diferente a cada dia por todo o período anterior a 30 de junho de 1994. A apuração da perda do poder aquisitivo do cruzeiro real, levada em conta para a fixação da paridade diária com a URV, foi realizada com apoio em diversos índices de preços, entre eles o Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M), apurado pela Fundação Getúlio Vargas. No entanto, o índice atinente a julho e agosto de 1994 foi calculado de duas maneiras, sob a justificativa de que a observância do art. 38 produziria resíduo e não preservaria o equilíbrio econômico-financeiro das obrigações reajustáveis em curso. Isso apesar de a lei prever nulidade da aplicação de índice calculado de forma diferente daquela prevista no dispositivo. Uma das maneiras de cálculo do referido índice respeitou o teor do preceito, utilizando-se do chamado IGP-2 ou IGP-M “limpo” a fim de apurar a inflação comparando o real com o equivalente em URV para o dia da coleta de cada preço. De acordo com o IGP-2, a inflação em julho e em agosto foi de, respectivamente, 4,33% e 3,94%. A outra maneira de se proceder ao cálculo, o IGP-M conhecido por alguns economistas como IGP-M “sujo”, calculou a inflação comparando o real com o cruzeiro real, com base na última cotação da URV, de 30 de junho de 1994, ou seja, sem observar o art. 38. De acordo com o IGP-M “sujo”, a inflação em julho e em agosto foi de, respectivamente, 40% e 7,56%. O Tribunal entendeu que, para se calcular a inflação relativa a julho e agosto de 1994, quando em curso o real, os preços coletados para fins de apuração dos índices de correção monetária deveriam estar todos em bases comparáveis, para permitir a medição da perda do poder aquisitivo do real, e não da moeda já extinta, o cruzeiro real. O preceito em debate foi criado para que fossem comparados elementos de iguais atributos. Levar em conta apenas a última cotação da URV importaria retirada de efeito da regra, a criar contradição no sistema não desejada pela lei. Logo, a aplicação do IGP-2 preserva melhor o equilíbrio econômico-financeiro das obrigações pecuniárias em curso. O Tribunal reportou-se à orientação segundo a qual o estabelecimento de critério de conversão de moeda antiga em nova está inserido no âmbito da regulação do Sistema Monetário, ou do Direito Monetário, que, nos termos do art. 22, VI, da CF, é da competência privativa da União. Assentou inexistir expurgos inflacionários, sendo a alegação de existir defasagem na transição da moeda antiga para a nova insuficiente para afastar a aplicação do art. 38. A falácia do argumento reside no fato de que sempre que “falta” inflação no final da conta, “sobra” no início, pois o período de apuração não pode ser maior que o período de competência. Além disso, o Plenário consignou serem inaplicáveis ao caso as orientações proferidas no julgamento da ADI 493. Com efeito, o art. 38 da Lei 8.880/1994 não suprimiu o poder dos índices de correção monetária de aferir a perda do poder aquisitivo da moeda. De mais a mais, na aludida ação direta, não se discutiu a possibilidade de aplicação imediata de lei que introduz nova moeda em circulação. Quanto a esse aspecto, reputou ser constitucional a aplicação imediata do dispositivo às obrigações reajustáveis em curso, firmadas antes de seu advento, porquanto o art. 38 tem natureza institucional estatutária. Ele é parte integrante e inseparável das leis e medidas provisórias responsáveis pela introdução do real. A incidência imediata não decorre de a lei ser de ordem pública, mas do fato de instituir novo estatuto legal. Consoante a jurisprudência da Corte, não é possível opor a cláusula de proteção ao direito adquirido ou ato jurídico perfeito em face da aplicação imediata de normas que tratam de regime monetário, as quais possuem natureza estatutária e institucional, como é a situação daquelas responsáveis por substituir uma moeda por outra. Concluiu que o artigo adversado estabeleceu lógica adequada sob as ópticas jurídica e econômica, é imanente à mudança da moeda e, em sua criação, esteve presente o espírito da preservação do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos. O ministro Alexandre de Moraes enfatizou que o IGP-M “sujo” contou duas vezes a inflação e, com sua aplicação, haveria enriquecimento ilícito. Esse índice foi gerado porque se ignorou a lógica da implantação do novo sistema monetário de absorver, desde a criação da URV, dia a dia a inflação. Vencidos os ministros Marco Aurélio e Celso de Mello, que deram interpretação conforme ao dispositivo em comento, para assentar que ele não se sobrepõe aos atos jurídicos perfeitos e acabados, os quais devem ser respeitados. O ministro Marco Aurélio entendeu que o artigo não versou o padrão monetário, e, sim, a correção monetária. Por seu turno, o ministro Celso de Mello compreendeu que mesmo os efeitos futuros oriundos de contratos anteriormente celebrados não se expõem ao domínio normativo de leis supervenientes, ainda que disciplinadoras e institutivas de regime monetário.
O Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direita para declarar a inconstitucionalidade da Lei Complementar 142/2011 do Estado do Rio de Janeiro, que disciplina a organização e o funcionamento do tribunal de contas estadual. O Tribunal afirmou que a lei complementar fluminense, de origem parlamentar, contrariou o disposto nos arts. 73, 75 e 96, II, d (1), da Constituição Federal (CF). Ao alterar diversos dispositivos da Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, dispondo sobre sua forma de atuação e suas competências, bem como sobre suas garantias, deveres e organização, a referida norma invadiu matéria de iniciativa legislativa privativa da própria corte de contas. Os tribunais de contas, conforme reconhecido pela Constituição de 1988 e pelo Supremo Tribunal Federal (STF), gozam das prerrogativas da autonomia e do autogoverno, o que inclui, essencialmente, a iniciativa privativa para instaurar processo legislativo que pretenda alterar sua organização e funcionamento. O ultraje à prerrogativa de instaurar o processo legislativo privativo traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente concretizado.
O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade do art. 81, IV, da Constituição do Estado do Maranhão, acrescentado pela Emenda Constitucional 34/2001. O dispositivo impugnado inclui, entre as autoridades com foro criminal originário perante o tribunal de justiça, os procuradores de Estado, os procuradores da assembleia legislativa, os defensores públicos e os delegados de polícia. Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, redator para o acórdão. Para ele, ao dispor sobre os órgãos do Poder Judiciário, o art. 92 da Constituição Federal (CF) (1) previu como regra que a primeira e a segunda instâncias constituem juízo natural com cognição plena para a questão criminal. Apenas excepcionalmente a CF conferiu prerrogativas de foro para as autoridades federais, estaduais e municipais. No ponto, citou, como exemplo, a competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para processar e julgar o presidente da República, o vice-presidente, membros do Congresso Nacional, seus próprios ministros e o procurador-geral da República; a competência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para processar e julgar os desembargadores; e a competência dos tribunais de justiça para processar e julgar os membros do ministério público estadual, os próprios magistrados e os prefeitos municipais. Sublinhou a inviabilidade de se aplicar, nesse caso, o princípio da simetria, uma vez que a CF estabelece prerrogativa de foro nos três níveis: federal, estadual e municipal. Ressaltou que interpretação que conferisse às constituições estaduais a possibilidade de definir foro, considerando o princípio federativo e com esteio no art. 125, § 1º, da CF (2), permitiria aos Estados dispor, livremente, sobre essas prerrogativas, o que seria equivalente a assinar um cheque em branco. Por fim, esclareceu que o vice-governador, os secretários de Estado e o comandante dos militares estaduais, por determinação expressa do art. 28 da CF (3), também possuem prerrogativa de foro, independentemente de a constituição estadual fixá-la ou não. Vencidos, em parte, os ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello, que julgaram o pleito procedente apenas para declarar a inconstitucionalidade da expressão “delegados de polícia”, incluída no art. 81, IV, da Constituição estadual. Consideraram que a competência dos tribunais de justiça é estabelecida pela constituição estadual (CF, art. 125, § 1º). Portanto, eventualmente, a competência originária do tribunal de justiça pode ser estendida mesmo para autoridades para as quais a Constituição Federal não resguarda paralelo. Ademais, reputaram não violado o art. 22, I, da CF (4), visto que a questão relativa à prerrogativa possui mais natureza constitucional e política do que processual. Quantos aos delegados de polícia, a despeito da relevância de suas atribuições, a jurisprudência do STF impede que seja conferida essa prerrogativa.
A Primeira Turma, por maioria, deu provimento a agravo regimental interposto em face de decisão monocrática que, ao negar seguimento a recurso extraordinário, manteve o foro por prerrogativa de função de prefeito denunciado por delitos cometidos em mandato anterior. A Turma determinou a remessa dos autos à primeira instância, mantida a validade de todos os atos praticados por tribunal de justiça responsável pelo recebimento de denúncia contra prefeito que supostamente havia praticado os fatos imputados em mandato anterior e, após o interregno de 4 anos, foi eleito para um novo mandato de prefeito. Considerou não se tratar, portanto, de reeleição. O Colegiado reafirmou jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal (STF) no sentido de que o foro por prerrogativa de função se aplica apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. Entretanto, a prerrogativa de foro relaciona-se às funções desempenhadas na atualidade e a jurisprudência da Corte não abrange os interregnos de mandatos. No caso, após o término do primeiro mandato, no qual supostamente praticados os delitos apurados, a ação deveria ter sido encaminhada para a primeira instância. O fato de o denunciado ter assumido novo mandato de prefeito não enseja a prorrogação do foro. Vencido, em parte, o ministro Marco Aurélio, que restringia a preservação de atos tão somente quanto àqueles de conteúdo instrutório. Vencida a ministra Rosa Weber (relatora), que negou provimento ao recurso, mantida a definição de competência feita pelo tribunal de justiça local.
Não é necessário o ajuizamento de ação autônoma para o pagamento dos consectários legais inerentes à reparação econômica devida a anistiado político e reconhecida por meio de Portaria do ministro da Justiça, a teor do disposto no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) e no art. 6º, § 6º, da Lei 10.559/2002. Não é necessário o ajuizamento de ação autônoma para o pagamento dos consectários legais inerentes à reparação econômica devida a anistiado político e reconhecida por meio de Portaria do ministro da Justiça, a teor do disposto no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) (1) e no art. 6º, § 6º, da Lei 10.559/2002 (2). Com base nesse entendimento, a Primeira Turma deu provimento a recurso em mandado de segurança para afastar a multa imposta à recorrente. Além disso, determinou à União que disponibilize ao anistiado a parcela da reparação econômica de caráter retroativo, acrescida de juros da mora e correção monetária. A Turma afirmou que o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar os embargos de declaração no RE 553.710 (Tema 394 da repercussão geral), reconheceu que os valores retroativos previstos nas portarias de anistia deverão ser acrescidos de juros da mora e de correção monetária.
A participação de magistrado em julgamento de caso em que seu pai já havia atuado é causa de nulidade absoluta, prevista no art. 252, I, do Código de Processo Penal (CPP). A participação de magistrado em julgamento de caso em que seu pai já havia atuado é causa de nulidade absoluta, prevista no art. 252, I, do Código de Processo Penal (CPP) (1). Com base nesse entendimento, a Segunda Turma, por maioria, concedeu habeas corpus para anular julgamento de recurso em sentido estrito e determinar que outro seja proferido sem a participação do magistrado impedido. O colegiado considerou o fato de que o pai do magistrado julgador do recurso em sentido estrito havia participado anteriormente do julgamento de outro habeas corpus impetrado pela paciente e de apelação interposta por corréu perante o tribunal de justiça a quo. Reconheceu a existência de efetivo prejuízo para a paciente. Afastou a aplicação de precedente do Plenário que, com base no princípio processual penal pas de nullité sans grief, concluiu que a atuação de ministro da Corte, supostamente impedido, não influiria no resultado do julgamento. Na situação analisada, o órgão colegiado do tribunal de origem era formado por apenas três magistrados. A exclusão do desembargador impedido acarretaria substancial alteração no resultado do julgamento, porque, sem ele, não haveria sequer quórum para a própria instalação da sessão de julgamento. Vencido o ministro Edson Fachin, que não conheceu do habeas corpus por dois fundamentos. Primeiro, a impetração seria incabível, na linha de precedentes da Corte, porque voltada contra decisão monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça. Segundo, diante da certificação do trânsito em julgado da decisão do tribunal de origem, o writ seria utilizado como substituto da revisão criminal. Concluiu, em seguida, pela inexistência de situação de ilegalidade flagrante ou situação teratológica apta a mitigar esses óbices. Para o ministro Fachin, não houve vulneração à imparcialidade do Estado-juiz. Isso porque os julgadores ligados por vínculo de parentesco não integraram o mesmo colegiado durante um mesmo julgado, mas atuaram em incidentes subsequentes diversos. Esclareceu, no ponto, que a norma constante do art. 253 do CPP (2) visa evitar, por meio de presunção de parcialidade, que determinada compreensão individual na prática tenha feitio de colegiado. Considerou que, no caso, não se deu votação alinhada e conjunta que acarretasse desequilíbrio na interação de forças argumentativas. Também não foi demonstrado prejuízo, o que essencial à declaração de nulidade, relativa ou absoluta, a teor do art. 563 do CPP (3).