Citação judicial supre notificação do devedor sobre cessão de crédito em ação de cobrança
Por ocasião do julgamento do REsp 1.119.558/SC, Primeira Seção, DJe 01/08/2012, sob a sistemática do art. 543-C do CPC, ficou consignado que "os créditos decorrentes da obrigação de devolução do empréstimo compulsório, incidente sobre o consumo de energia elétrica, podem ser cedidos a terceiros, uma vez inexistente impedimento legal expresso à transferência ou à cessão dos aludidos créditos, nada inibindo a incidência das normas de direito privado à espécie, notadamente do art. 286 do Código Civil". E, outrossim, que "o art. 286 do Código Civil autoriza a cessão de crédito, condicionada à notificação do devedor". Nesse contexto, decidiu o acórdão embargado da Segunda Turma que "a validade da cessão de créditos oriundos da devolução de empréstimo compulsório sobre energia elétrica submete-se não apenas ao preenchimento dos requisitos insertos no art. 104 do CC, como também ao fato de a devolução do empréstimo compulsório não se dar mediante a compensação dos débitos com valores resultantes do consumo de energia, ficando sua eficácia sujeita à notificação do cedido (art. 286 do CC)." Asseverou ainda que, "a cessionária não se desincumbiu do ônus de notificar formalmente a parte devedora - Eletrobrás. Cabe ressaltar que, diferentemente do alegado pela agravante, a proposição do cumprimento de sentença, por si só, não equivale à notificação formal da devedora. Deveria, no caso, a cessionária dar ciência da cessão à Eletrobrás antes da propositura da cobrança judicial." (AgInt no AREsp 1.125.139/PR, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 27/08/2018). Por sua vez, o acórdão paradigma da Terceira Turma consignou a tese de que "a ausência de notificação do devedor a respeito da cessão de crédito, não pode ser alegada pelo credor [rectius: devedor] quando esse teve conhecimento da cessão quando citado na ação executiva." (AgRg no AREsp 545.311/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 23/03/2015). Frisa-se, desde logo, que não se vislumbra nenhuma circunstância distintiva no fato de a cessão em tela se referir a crédito oriundo de empréstimo compulsório, tampouco no fato de a devolução do empréstimo compulsório não poder se dar mediante a compensação dos débitos com valores resultantes do consumo de energia. A controvérsia cinge-se, na verdade, a saber se a citação da devedora em ação movida pelo cessionário atende a finalidade precípua do art. 290 do Código Civil, que é a de "dar ciência" ao devedor do negócio, por meio de "escrito público ou particular." Pelo que se pode inferir da norma sob análise (art. 290 do Código Civil: A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.), a finalidade é informar ao devedor quem é o seu novo credor. É importante ressaltar que o devedor fica dispensado de ter de pagar novamente ao credor-cessionário, se já saldou a dívida diretamente com o credor originário. Ademais, o devedor pode opor ao credor-cessionário as exceções de caráter pessoal que teria em relação ao credor-cedente, anteriores a transferência do crédito e também posteriores, até o momento da cobrança, conforme dispõe o art. 294 do Código Civil (O devedor pode opor ao cessionário as exceções que lhe competirem, bem como as que, no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha contra o cedente). Cabe ressaltar que, segundo precedente deste Tribunal Superior, "[a] falta de notificação do devedor sobre a cessão do crédito não torna a dívida inexigível (art. 290 do CC/02)" (REsp 1.882.117/MS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 12/11/2020). Nesse contexto, se ausência de comunicação da cessão do crédito não afasta a exigibilidade da dívida, a questão está melhor decidida pelo acórdão paradigma, ao considerar suficiente a citação do devedor na ação de cobrança ajuizada pelo credor-cessionário para atender ao comando do art. 290 do Código Civil, que é a de "dar ciência" ao devedor do negócio, por meio de "escrito público ou particular." Com efeito, a partir da citação, o devedor toma ciência inequívoca da cessão de crédito e, por conseguinte, a quem deve pagar. Assim, a citação revela-se suficiente para cumprir a exigência de cientificar o devedor da transferência do crédito.
Dispensa de custas processuais nos embargos de divergência em matéria penal
Ao analisar os jugados da Corte Especial, no que se refere à necessidade de pagamento de custas para o processamento de embargos de divergência em matéria penal, constata-se que a questão tem sido solucionada de formas díspares. Em julgamento recente, a Corte Especial reiterou entendimento pela obrigatoriedade de recolhimento das custas em embargos de divergência em matéria penal. A Lei n. 11.636/2007, que dispõe sobre as custas judiciais devidas no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, prevê: "Art. 7.º Não são devidas custas nos processos de habeas data, habeas corpus e recursos em habeas corpus, e nos demais processos criminais, salvo a ação penal privada.". Por sua vez, a Resolução STJ/GP n. 2 de 1.º de fevereiro de 2017, repetindo a norma legal, dispõe: "Art. 3.º Haverá isenção do preparo nos seguintes casos: I - nos habeas data, habeas corpus e recursos em habeas corpus; II - nos processos criminais, salvo na ação penal privada e sua revisão criminal; [...]". Entretanto, em se tratando de recurso em matéria penal, a interpretação da norma processual que deve prevalecer é aquela mais consentânea com o direito à ampla defesa e ao contraditório. Com efeito, a Lei de regência não fala de isenção para recursos apenas de natureza exclusivamente penal. A norma de isenção de preparo se refere a processos criminais. No caso, não há dúvida de que os embargos de divergência, embora não sejam previstos na legislação processual penal, são inquestionavelmente cabíveis e foram manejados dentro de um processo criminal, razão pela qual deve ser inexigível o pagamento de custas processuais. Registra-se, ademais, que a despeito de também ter havido decisões discrepantes no âmbito da Terceira Seção, a questão foi amplamente rediscutida, tendo decidido aquele Colegiado, à unanimidade, pela inexigibilidade de pagamento de custas processuais em embargos de divergência oriundos de ação penal pública.
Multa e honorários do art 523 §1º CPC em crédito extraconcursal na recuperação judicial
A multa e os honorários advocatícios previstos no art. 523, § 1º, do CPC/2015 somente incidem sobre o valor da condenação nas hipóteses em que o executado não paga voluntariamente a quantia devida estampada no título judicial no prazo de 15 dias. Nos termos do art. 49, caput, da Lei n. 11.101/2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido (ainda que não vencidos), sendo certo que a aferição da existência ou não do crédito deve levar em consideração a data da ocorrência de seu fato gerador (fonte da obrigação). Na hipótese, contudo, ressai que o crédito em discussão possui caráter extraconcursal, não se sujeitando, desse modo, aos efeitos do plano de soerguimento. Sucede que, nos termos do art. 59, caput, da LFRE, tão somente as dívidas da recuperanda sujeitas ao plano de soerguimento (créditos concursais) necessitam, em obediência à sistemática própria da lei de regência, ser adimplidas de acordo com as condições nele pactuadas. As obrigações não atingidas pela recuperação judicial, consequentemente, devem continuar sendo cumpridas normalmente pela devedora, uma vez que os créditos correlatos estão excluídos do plano e de seus efeitos. Dessa forma, a recuperanda não está impedida de satisfazer voluntariamente créditos extraconcursais perseguidos em execuções individuais, de modo que as consequências jurídicas previstas na norma do dispositivo precitado devem incidir quando não pago o montante devido. Não é, portanto, defeso à recuperanda dispor de seu acervo patrimonial para pagamento de créditos extraconcursais (observada a exceção do art. 66 da LFRE), uma vez recebida a comunicação do juízo do soerguimento para depósito da quantia objeto da execução, deve passar a correr o prazo de 15 dias estabelecido no art. 523, caput, do CPC/2015.
RSC na RT de docentes EBTT aposentados antes da Lei 12.772/2012 com titulação prévia
Por força da Lei n. 12.772/2012, que dispõe sobre o Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal, a remuneração dos servidores é composta de duas parcelas, Vencimento Básico e Retribuição de Titulação (RT). Segundo o art. 17, § 1º, a RT é considerada no cálculo dos proventos de aposentadoria. Sua concessão é feita de forma objetiva, com base em certificados ou títulos obtidos antes da aposentação. A norma, para os cargos da Carreira de Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, criou o instrumento denominado Reconhecimento de Saberes e Competências (RSC) para facilitar a aquisição do direito à RT, de modo que a soma de um RSC a um determinado título equivalerá a um outro título de natureza superior. Assim, a concessão do RSC impacta no pagamento da RT. Os pressupostos, diretrizes e procedimentos para a concessão do RSC estão estabelecidos na Resolução n. 1/2014 do Conselho Permanente para o Reconhecimento de Saberes e Competências, instituído pelo Ministério da Educação (art. 1º da Portaria n. 491/2013). Seus efeitos, conforme o art. 15, retroagem a 1º/3/2013. Consigna-se ainda que, por força do art. 7º da Resolução n. 1/2014, "a apresentação de atividades para obtenção do RSC independe do tempo em que as mesmas foram realizadas". Todos esses aspectos evidenciam que a vantagem correspondente ao reconhecimento da RSC não é uma retribuição por produtividade alcançada durante o exercício da função, ou seja, não corresponde a uma gratificação propter laborem. Seu nascedouro é, na verdade, uma avaliação da situação acadêmica do servidor. O RSC, como parcela que, somada a um título de graduação, pós-graduação ou mestrado, adianta o recebimento de uma RT, corresponde a uma verba paga de modo linear e genérico aos professores em atividade. Ou seja, não é devida em razão do exercício da função em condições especiais, alcançando a todos, sem exceção. Por esse motivo, deve também ser pago aos servidores inativos, afirmado o direito à paridade.
Sentença superveniente não acarreta perda de objeto do agravo de instrumento sobre prescrição
O exame dos efeitos da prolação de sentença na pendência de julgamento de agravo de instrumento não é questão nova no processo civil brasileiro. No entanto, o debate ganhou novo impulso com o advento do Código de Processo Civil de 2015 e de seu art. 1.015, que elenca as diversas hipóteses de cabimento do agravo de instrumento, disposição legal que, por si só, gera controvérsias e divergências. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, sem descurar da necessidade do exame casuístico da matéria e da apuração, sempre em cada hipótese, do teor da decisão interlocutória, da sentença e da relação estabelecida entre elas, fixou o entendimento de que seria imprescindível observar-se os critérios da cognição e da hierarquia para a adequada resolução da questão. Com efeito, pelo critério da cognição, o conhecimento exauriente da sentença absorveria a cognição sumária da decisão interlocutória, havendo a perda superveniente do objeto do agravo. Por outro lado, pelo critério da hierarquia, haveria que se reconhecer a prevalência da decisão de segundo grau sobre a singular, quando então o julgamento do agravo se imporia. Em síntese, fixou-se o entendimento de que "o juízo acerca do destino conferido ao agravo após a prolação da sentença não pode ser engendrado a partir da escolha isolada e simplista de um dos referidos critérios, fazendo-se mister o cotejo com a situação fática e processual dos autos, haja vista que a pluralidade de conteúdos que pode assumir a decisão impugnada, além de ensejar consequências processuais e materiais diversas, pode apresentar prejudicialidade em relação ao exame do mérito. A pedra angular que põe termo à questão é a averiguação da realidade fática e o momento processual em que se encontra o feito, de modo a sempre perquirir acerca de eventual e remanescente interesse e utilidade no julgamento do recurso". De fato, o recurso de agravo de instrumento, como cediço, é recurso interposto em face de decisões interlocutórias, que representam pronunciamentos judiciais dotados de relevante conteúdo decisório voltados a resolver diversas questões incidentes, sem pôr fim ao processo ou à fase de conhecimento. Desse modo, é forçoso concluir que "a superveniência de sentença no processo principal não conduz, necessariamente, à perda do objeto do Agravo de Instrumento contra decisão interlocutória do mesmo processo, devendo-se considerar em cada caso, o teor da decisão interlocutória agravada e o conteúdo da sentença superveniente para o fim de se verificar a prejudicialidade". No caso, a questão vertida no agravo de instrumento - consumação da prescrição - integra o rol de questões que representam antecedentes lógicos da apreciação do mérito da demanda. Nesse passo, se porventura for acolhida a preliminar de prescrição suscitada pela recorrente, será fulminada, total ou parcialmente, a pretensão deduzida pelo recorrido, de modo a impedir o julgamento do pedido ou, ao menos, a direcionar o modo pelo qual o pedido deverá ser julgado.