Este julgado integra o
Informativo STF nº 471
Comentário Damásio
Conteúdo Completo
A Turma deferiu, em parte, habeas corpus para anular, a partir da decisão que recebera a denúncia, inclusive, processo instaurado contra funcionário público denunciado, com base em elementos de informação obtidos em inquérito policial, pela prática dos crimes previstos nos artigos 146, § 1º; 158, § 1º; e caput, todos do CP, e no art. 3º, a, da Lei 4.898/65. No caso, fora imputado ao co-réu a infração dos artigos 299, caput, e 349, ambos do CP, sendo descrito na denúncia que o paciente supostamente teria, com outras pessoas, todas na qualidade de policiais, exigido de comerciante a devolução de cheque que este recebera de cliente, além de haver exigido, desse mesmo comerciante, determinada quantia que, paga em cheque, fora apresentada pelo co-denunciado, gerente de estabelecimento comercial, para compensação, não efetuada porque sustada a cártula. Com o oferecimento da inicial, o Ministério Público requerera o indiciamento formal dos denunciados, cujo pedido fora atendido na decisão que recebera a peça. Contra esta decisão, impetrara-se writ no tribunal de justiça estadual, resultando na exclusão do delito previsto no art. 3º, a, da Lei 4.898/65. Em passo seguinte, o STJ, em idêntica medida, afastara somente o indiciamento formal. No presente habeas, pleiteava-se o trancamento da ação penal e, subsidiariamente, a nulidade do feito por inobservância de rito processual, pois os fatos narrados amoldar-se-iam aos delitos de corrupção passiva ou concussão, repisando-se, para tanto, as alegações de: a) falta de indícios suficientes de autoria e prova da materialidade; b) ausência da notificação prévia prevista no art. 514 do CPP e c) abuso na capitulação jurídica dos fatos narrados na denúncia. Inicialmente, considerou-se que a via eleita não seria adequada para o exame da insuficiência dos indícios de autoria e da prova da materialidade, por revolver a análise de fatos e provas que lastrearam a denúncia. Em seguida, aduziu-se que, na espécie, não haveria que se falar em preclusão quanto à alegada falta de notificação prévia, haja vista que, quando do ajuizamento da impetração, o processo principal não se encontrava sequer na fase de defesa prévia. Assim, reputou-se possível a apreciação da incidência ou não do art. 514 do CPP, cujo procedimento se reserva, conforme precedentes do STF, às hipóteses em que a denúncia veicula tão-somente crimes funcionais típicos. No ponto, embora salientando que a qualificação jurídica contida na inicial não permitiria a aplicação do procedimento especial, asseverou-se que o seu cabimento deveria ser avaliado a partir dos fatos descritos na denúncia, e não da classificação dada pelo parquet. Nesse sentido, ressaltou-se que o juízo local, ao receber a denúncia, deveria ter verificado se existiria, ou não, erro na qualificação jurídica do fato que pudesse alterar o procedimento a ser adotado. Dessa forma, tendo em conta os fatos narrados na peça acusatória oferecida contra o paciente e o co-réu, entendeu-se ser manifesto não se tratar do crime de extorsão, mas sim de concussão (CP, art. 316), porquanto praticado por funcionário público, em razão da função. Afastou-se, também, eventual configuração do delito de corrupção passiva (CP, art. 317), uma vez que, no caso, a exigência — e não a solicitação — concretizara-se por meio de amea¬ça, a qual constituiria meio de execução da concussão, sendo por ela absorvida. Sendo assim, restaria, ao lado da concussão, apenas o delito de falsidade ideológica atribuído ao co-réu, cuja denúncia não especificara, com precisão, a sua conduta de modo a enquadrá-la no citado tipo. Por conseguinte, concluiu-se que o co-réu estaria respondendo somente pelo crime de favorecimento real (CP, art. 349) e o paciente, por concussão, que configura crime funcional típico. Assim, aplicou-se a nova orientação firmada pela Corte, em obter dictum (HC 85779/RJ, j. em 28.2.2007, v. Informativo 457), no sentido de que a notificação prévia não é dispensada quando a denúncia se apóie em inquérito policial. No ponto, afirmou-se que, havendo inquérito, apenas ficam dispensados os elementos de informação mencionados no art. 513 do CPP. HC deferido a fim de que se obedeça ao procedimento previsto nos artigos 514 e seguintes do CPP e, em caso de novo recebimento da denúncia, que o seja apenas pelo delito de concussão. Por fim, de ofício, concedeu-se a ordem ao co-réu.
Legislação Aplicável
CPP, arts. 513; 514. CP, arts. 146, § 1º; 158, § 1º, caput; 299, caput; 316; 317; 349. Lei 4.898/1965, no art. 3º, a.
Informações Gerais
Número do Processo
89686
Tribunal
STF
Data de Julgamento
12/06/2007