Supremo Tribunal Federal • 6 julgados • 27 de abr. de 2017
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A Emenda Constitucional 46/2005 não interferiu na propriedade da União, nos moldes do art. 20, VII, da Constituição da República, sobre os terrenos de marinha e seus acrescidos situados em ilhas costeiras sede de Municípios. A Emenda Constitucional (EC) 46/2005 não interferiu na propriedade da União, nos moldes do art. 20, VII, da Constituição Federal (CF), sobre os terrenos de marinha e seus acrescidos situados em ilhas costeiras sede de Municípios. Com base nessa orientação, o Plenário, por maioria, negou provimento a recurso extraordinário em que se discutia a situação dominial, à luz do art. 20, IV, da CF, dos terrenos de marinha e seus acrescidos localizados em ilha costeira com sede de Município — no caso, Vitória/ES — após a promulgação da Emenda Constitucional (EC) 46/2005. O Colegiado entendeu que os terrenos de marinha e seus acrescidos situados na ilha costeira em que sediado o Município de Vitória constituem bens federais. Inicialmente, observou que a alteração introduzida pela EC 46/2005 criou, no ordenamento jurídico, exceção à regra geral então vigente sobre a propriedade das ilhas costeiras. Com a redação conferida ao art. 20, IV, da CF pelo constituinte derivado, deixaram de pertencer à União as ilhas costeiras em que sediados entes municipais, expressamente ressalvadas, no novo comando constitucional, as “áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal e as referidas no art. 26, II”, que remanesceram no patrimônio federal. Entretanto, com a mencionada alteração, não mais se poderia presumir a propriedade da União sobre terras localizadas nas ilhas em que contida sede de Município, ou seja, com a EC 46/2005, deixou de constituir título hábil a ensejar o domínio da União o simples fato de determinada área estar localizada em ilha costeira, se nela estiver sediado Município. Desse modo, a propriedade da União sobre determinada área depende da existência de outro título para legitimá-la. Para o devido equacionamento da controvérsia, é necessário ter presente o art. 20, VII, da CF, cuja redação, dada pelo constituinte originário, a incluir, entre os bens da União, “os terrenos de marinha e seus acrescidos”, foi mantida mesmo após o advento da EC 46/2005. Desse modo, a EC 46/2005 nada alterou o regime jurídico-constitucional dos terrenos de marinha. Referiu-se à legislação de regência do instituto em vigor (1). Como bens públicos dominiais, “podem ser utilizados pela Administração inclusive para obtenção de resultados econômicos, o que supõe a possibilidade de uso pelos particulares”. Essa utilização pode ser formalizada por meio dos competentes instrumentos previstos pelo Direito, entre os quais o aforamento e a ocupação. Nessa forma de utilização do bem público por particular, o senhorio e proprietário do terreno é a União (CF, art. 20, VII), que possui o domínio direto do imóvel. A renda anual auferida pelo ente estatal é denominada foro, e a transmissão do bem, por ato “inter vivos”, onerosa ou gratuita, deve ser comunicada à União, que, não exercendo seu direito de compra, receberá o pagamento de laudêmio. O CC/2002, muito embora proíba, na esfera privada, a constituição de novas enfiteuses, remete o regramento do instituto, quanto aos terrenos de marinha e seus acrescidos, às disposições estabelecidas em lei especial, hoje, o Decreto-Lei 9.760/1946, entre outras normas esparsas. O Colegiado asseverou que o deslinde da controvérsia depende, essencialmente, da interpretação conferida ao inciso IV do art. 20 da CF, em sua redação atual. Estabelecida a regra geral de que constituem bens da União as ilhas oceânicas e as costeiras, o constituinte derivado excepcionou, no tocante ao domínio federal sobre as últimas, as que contenham a sede de Municípios, que foram trespassadas à propriedade municipal. Ressalvou, em seguida, “áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal”, bens que, não obstante situados em território municipal, pertencem à União. Consignou que uma interpretação sistemática do texto constitucional conduz à conclusão inarredável de que a alteração introduzida no inciso IV do art. 20 pela EC 46/2005 não teve o condão de mudar o regime patrimonial dos bens referidos no inciso VII nem de nenhum outro bem arrolado no mencionado dispositivo. Assim, a leitura proposta pelo recorrente, no sentido de que os terrenos de marinha e acrescidos foram transferidos ao ente municipal, leva à conclusão desarrazoada de que todos os demais bens constitucionalmente atribuídos à dominialidade da União — tais como potenciais de energia elétrica, recursos minerais, terras tradicionalmente ocupadas pelos índios —, se situados nas ilhas municipais, estão, após a EC 46/2005, igualmente excluídos do patrimônio federal. Assim, as ressalvas constantes da parte final do dispositivo emendado devem ser compreendidas como adendos aos demais bens integrantes do acervo patrimonial da União. Ademais, os terrenos de marinha e seus acrescidos, do ponto de vista histórico, já integravam o rol de bens da União, mesmo antes de as ilhas costeiras passarem a compor o patrimônio federal, a reforçar o rechaço à tese de que teria sido alterado o tratamento jurídico a eles conferido em razão da modificação introduzida pela EC 46/2005 na propriedade das ilhas marítimas. Também destoa do sistema de distribuição de bens entre as entidades da Federação entender que os Municípios sediados em ilhas sejam proprietários dos terrenos de marinha, e não o sejam os Municípios costeiros. Com a EC 46/2005, portanto, as ilhas costeiras em que situada a sede de Município passaram a receber o mesmo tratamento da porção continental do território brasileiro no tocante ao regime de bens da União. A Corte salientou o fato de ter sido o princípio da isonomia a “ratio essendi” das propostas de emenda à Constituição que deram origem à EC 46/2005. A isonomia aspirada pelo constituinte derivado operou-se em prestígio da autonomia municipal preconizada na Carta de 1988 e cuidou de equiparar o regime jurídico-patrimonial das ilhas costeiras em que sediados Municípios àquele incidente sobre suas porções continentais, favorecendo a promoção dos interesses locais e o desenvolvimento da região. Equivocado supor que, no afã de se estabelecer tratamento isonômico entre Municípios continentais e insulares, se devesse adotar, entre duas interpretações possíveis, aquela que elastecesse o comando constitucional ao ponto de, sem motivo justificado, lhes conceder tratamento diferenciado. Na averiguação dos efeitos da EC 46/2005 sobre o regime patrimonial dos bens arrolados no art. 20, VII, da CF, deve-se adotar interpretação que privilegie a realização da igualdade preconizada no sistema constitucional pátrio. A pretendida geração de efeitos desuniformes com relação aos terrenos de marinha e acrescidos situados nos Municípios com sede em território continental e aqueles sediados nas ínsulas costeiras carece de “elemento diferencial” que a autorize. Dessa forma, em respeito ao princípio da isonomia, cumpre entender incidente a previsão contida no art. 20, VII, da CF sobre ilhas costeiras e continente, indistintamente. Dessa forma, o Plenário concluiu serem incólumes as relações jurídicas decorrentes da propriedade da União sobre as áreas referidas no inciso VII do art. 20 da CF após a modificação promovida no inciso IV do mesmo dispositivo pela EC 46/2005. Vencido o ministro Marco Aurélio, que dava provimento ao recurso. Para ele, diante da EC 46/2005, não se haveria como concluir que os terrenos de ilhas costeiras, em que se tem sede do Município, continuam na propriedade da União.
Nos casos autorizados constitucionalmente de acumulação de cargos, empregos e funções, a incidência do art. 37, XI, da Constituição Federal pressupõe consideração de cada um dos vínculos formalizados, afastada a observância do teto remuneratório quanto ao somatório dos ganhos do agente público. Nos casos autorizados constitucionalmente de acumulação de cargos, empregos e funções, a incidência do art. 37, XI (1), da Constituição Federal (CF) pressupõe consideração de cada um dos vínculos formalizados, afastada a observância do teto remuneratório quanto ao somatório dos ganhos do agente público. Com base nesse entendimento, o Plenário, em julgamento conjunto e por maioria, negou provimento a recursos extraordinários e reconheceu a inconstitucionalidade da expressão “percebidos cumulativamente ou não” contida no art. 1º da Emenda Constitucional (EC) 41/2003, que alterou a redação do art. 37, XI, da CF, considerada interpretação que englobe situações jurídicas a revelarem acumulação de cargos autorizada constitucionalmente. Além disso, declarou a inconstitucionalidade do art. 9º da EC 41/2003 (2), para afastar definitivamente o art. 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) (3), por já ter surtido efeitos na fase de transformação dos sistemas constitucionais — Cartas de 1967/1969 e 1988 —, excluída a abrangência a ponto de fulminar direito adquirido. No caso, os acórdãos recorridos revelaram duas conclusões principais: a) nas acumulações compatíveis com o texto constitucional, o que auferido em cada um dos vínculos não deve ultrapassar o teto constitucional; e b) situações remuneratórias consolidadas antes do advento da EC 41/2003 não podem ser atingidas, observadas as garantias do direito adquirido e da irredutibilidade de vencimentos, porque oponíveis ao poder constituinte derivado. O Colegiado afirmou que a solução da controvérsia pressupõe interpretação capaz de compatibilizar os dispositivos constitucionais em jogo, no que aludem ao acúmulo de cargos públicos e das respectivas remunerações, incluídos os vencimentos e proventos decorrentes da aposentadoria, considerados os preceitos atinentes ao direito adquirido (CF, art. 5º, XXXVI) e à irredutibilidade de vencimentos (CF, art. 37, XV). Ressaltou que a percepção somada de remunerações relativas a cargos acumuláveis, ainda que acima, no cômputo global, do patamar máximo, não interfere nos objetivos que inspiram o texto constitucional. As situações alcançadas pelo art. 37, XI, da CF são aquelas nas quais o servidor obtém ganhos desproporcionais, observadas as atribuições dos cargos públicos ocupados. Admitida a incidência do limitador em cada uma das matrículas, descabe declarar prejuízo à dimensão ética da norma, porquanto mantida a compatibilidade exigida entre trabalho e remuneração. Assentou que as possibilidades que a CF abre em favor de hipóteses de acumulação de cargos não são para benefício do servidor, mas da coletividade. Assim, o disposto no art. 37, XI, da CF, relativamente ao teto, não pode servir de desestímulo ao exercício das relevantes funções mencionadas no inciso XVI (4) dele constante, repercutindo, até mesmo, no campo da eficiência administrativa. Frisou que a incidência do limitador, considerado o somatório dos ganhos, ensejaria enriquecimento sem causa do Poder Público, pois viabiliza retribuição pecuniária inferior ao que se tem como razoável, presentes as atribuições específicas dos vínculos isoladamente considerados e respectivas remunerações. Ademais, essa situação poderá potencializar situações contrárias ao princípio da isonomia, já que poderia conferir tratamento desigual entre servidores públicos que exerçam idênticas funções. O preceito concernente à acumulação preconiza que ela é remunerada, não admitindo a gratuidade, ainda que parcial, dos serviços prestados, observado o art. 1º da CF, no que evidencia, como fundamento da República, a proteção dos valores sociais do trabalho. Enfatizou que o ordenamento constitucional permite que os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) acumulem as suas funções com aquelas inerentes ao Tribunal Superior Eleitoral (CF, art. 119), sendo ilógico supor que se imponha o exercício simultâneo, sem a correspondente contrapartida remuneratória. Da mesma forma, os arts. 95, parágrafo único, I, e 128, § 5º, II, “d”, da CF veiculam regras quanto ao exercício do magistério por juízes e promotores de justiça, de maneira que não se pode cogitar, presente o critério sistemático de interpretação, de trabalho não remunerado ou por valores inferiores aos auferidos por servidores que desempenham, sem acumulação, o mesmo ofício. Idêntica orientação há de ser observada no tocante às demais circunstâncias constitucionais de acumulação de cargos, empregos e funções públicas, alusivas a vencimento, subsídio, remuneração oriunda do exercício de cargos em comissão, proventos e pensões, ainda que os vínculos digam respeito a diferentes entes federativos. Consignou que consubstancia direito e garantia individual o acúmulo tal como estabelecido no inciso XVI do art. 37 da CF, a encerrar a prestação de serviços com a consequente remuneração, ante os diversos cargos contemplados, gerando situação jurídica na qual os valores devem ser recebidos na totalidade. O teto remuneratório não pode atingir, a partir de critérios introduzidos por emendas constitucionais, situações consolidadas, observadas as regras preexistentes, porque vedado o confisco de direitos regularmente incorporados ao patrimônio do servidor público ativo ou inativo (CF, arts. 5º, XXXVI, e 37, XV). Essa óptica deve ser adotada quanto às ECs 19/1998 e 41/2003, no que incluíram a expressão “percebidos cumulativamente ou não” ao inciso XI do art. 37 da CF. Cabe idêntica conclusão quanto ao art. 40, § 11, da CF, sob pena de criar situação desigual entre ativos e inativos, contrariando preceitos de envergadura maior, entre os quais a isonomia, a proteção dos valores sociais do trabalho — expressamente elencada como fundamento da República —, o direito adquirido e a irredutibilidade de vencimentos. As aludidas previsões limitadoras, a serem levadas às últimas consequências, além de distantes da razoável noção de teto, no que conduz, presente acumulação autorizada pela CF, ao cotejo individualizado, fonte a fonte, conflitam com a rigidez constitucional decorrente do art. 60, § 4º, IV, nela contido. Vencido o ministro Edson Fachin, que dava provimento aos recursos extraordinários. Pontuava que o art. 37, XI, da CF deveria ser interpretado literalmente, de modo que o teto deveria ser aplicado de forma global e não individualmente a cada cargo.
A garantia constitucional da gratuidade de ensino não obsta a cobrança por universidades públicas de mensalidade em cursos de especialização. Universidades públicas podem cobrar por curso de especialização A garantia constitucional da gratuidade de ensino não obsta a cobrança por universidades públicas de mensalidade em cursos de especialização. Com base nessa orientação, o Plenário, por maioria, deu provimento a recurso extraordinário para denegar segurança. Preliminarmente, o Colegiado, também por maioria, indeferiu pedido de sustentação oral do advogado do “amicus curiae” da Associação Nacional dos Pós-Graduandos (ANPG) já ter se exaurido a fase de sustentação oral na sessão anterior, e tendo ele se inscrito apenas na sessão subsequente. Vencidos, no ponto, os ministros Marco Aurélio, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski, que deferiam o pleito, ao fundamento de que, se há inscrito terceiro, sem que ainda tivesse sido proferido qualquer voto, se deveria, em prestígio ao devido processo legal, viabilizar a sustentação. Quanto ao mérito, inicialmente, o Colegiado observou que, a despeito da Súmula Vinculante 12 (1), alargar a sua aplicação para os cursos de extensão seria interpretação equivocada do verbete sumular. Asseverou haver no texto constitucional uma diferenciação entre “ensino”, “pesquisa” e “extensão”, que formam tripé harmônico e essencial para a educação de qualidade. Nos termos do art. 206, IV, da Constituição Federal (CF), a gratuidade do ensino é um princípio aplicável a todos os estabelecimentos oficiais. Para tanto, conforme exige o art. 212, “caput”, da CF, um percentual da receita pública deve ser destinado à “manutenção e desenvolvimento do ensino”. O art. 213, § 2º, da CF autoriza, “argumentum a contrario”, a captação de recursos destinados à pesquisa e à extensão porque os recursos públicos, a que se refere o art. 212, “caput”, da CF, têm destinação precípua às escolas públicas. Já as atividades descritas no art. 213, § 2º, da CF não necessariamente contam com recursos públicos. Seria incorreto, porém, concluir que a Constituição não exige financiamento público para a pesquisa e extensão. Explicou que a indissolubilidade entre “ensino, pesquisa e extensão”, princípio previsto no “caput” do art. 207 da CF, exige que o financiamento público não se destine exclusivamente ao ensino, visto que, para a manutenção e desenvolvimento do ensino, são necessários, nos termos do art. 207, pesquisa e extensão. Entretanto, há um espaço de conformação no texto constitucional para a definição das atividades que integram a manutenção e o desenvolvimento do ensino. De fato, o regime constitucional de pós-graduação deve derivar das exigências constitucionais contidas no art. 207 da CF. Impossível afirmar, com base na leitura estrita da CF, que as atividades de pós-graduação são abrangidas pelo conceito de manutenção e desenvolvimento do ensino, parâmetro constitucional para a destinação, com exclusividade, dos recursos públicos. Por isso, para a solução do presente caso, é preciso examinar se a instituição de cursos de pós-graduação (especialização) implica, necessariamente, gratuidade. O Colegiado frisou competir ao legislador a tarefa de disciplinar quais características determinado curso assumirá. Caso a atividade preponderante se refira à manutenção e ao desenvolvimento do ensino, a gratuidade deverá ser observada, nos termos do art. 206, IV, da CF. Para matéria relativa a ensino, pesquisa e extensão, a competência regulamentar é concorrente entre a União e os Estados-Membros (CF, art. 24, IX), mas também é afeta à autonomia universitária. Quanto a este último aspecto, a universidade pode contar, por expressa previsão constitucional (CF, art. 213, § 2º), com recursos de origem privada. Ademais, embora não disponham de competência para definir a origem dos recursos a serem utilizados para a manutenção e o desenvolvimento do ensino, as universidades podem definir quais são as atividades de pesquisa e extensão passíveis de realização em regime de colaboração com a sociedade civil. No exercício de sua competência para definir normas gerais (CF, art. 24, § 1º), a União editou a Lei 9.394/1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Dessa lei é possível depreender que os cursos de pós-graduação se destinam à preparação para o exercício do magistério superior (arts. 64 e 66) e, por isso, são indispensáveis para a manutenção e o desenvolvimento das instituições de ensino (art. 55). Porém, é preciso observar que apenas os cursos de pós-graduação que se destinam à manutenção e ao desenvolvimento do ensino são financiados pelo Poder Público. Novamente é a Lei 9.394/1996, em seus arts. 70 e 71, que fixa as regras para contabilizar essas despesas. Segundo o Tribunal, não se deve, evidentemente, ler a Constituição com fundamento na lei, mas sua referência exemplifica o fato de que ao legislador é possível descrever as atividades que, por não se relacionarem com a manutenção e o desenvolvimento do ensino, não dependem de recursos exclusivamente públicos. É lícito, dessa forma, às universidades perceber remuneração pelo seu desempenho. Além disso, a elaboração da lei não retira das universidades a competência para, por meio de sua autonomia, desenvolver outras atividades voltadas à comunidade que não se relacionem precisamente com a exigência constitucional da manutenção e do desenvolvimento do ensino. Essa observação vai ao encontro do próprio texto constitucional, ou seja, não há, na previsão de autonomia das universidades (CF, art. 207), remissão à regulamentação por lei, diversamente do que ocorre com as regras sobre a carreira dos professores (CF, art. 206, V), com a forma de gestão democrática (CF, art. 206, VI) e com a contratação de professores estrangeiros (CF, art. 207, § 1º). Há, aqui, potencialmente, um choque entre as competências legais do Poder Legislativo e normativas das universidades, ou do órgão encarregado de sua organização (CF, art. 211, § 1º). Esse conflito tem, em tese, assento constitucional e não legal. No caso, contudo, não há conflito a exigir a intervenção por parte do Supremo Tribunal Federal (STF). Tanto a CF quanto a lei dão margem ao juízo de conformação a ser realizado pelas universidades para definir se determinado curso de especialização destina-se à manutenção e ao desenvolvimento do ensino, hipótese em que, por expressa previsão constitucional, os recursos para seu financiamento deverão ser exclusivamente públicos. Nesse sentido, o art. 71 da Lei 9.394/1996 exclui das despesas de manutenção e desenvolvimento a formação de quadros especiais para a administração, caso em que, desde que restrita aos cursos de especialização, não haveria impedimento para as universidades, por analogia, disciplinarem outros cursos cuja cobrança de mensalidade fosse possível. O Colegiado afirmou ser evidente que as universidades não são completamente livres para definir suas atividades. O desempenho precípuo de suas funções exige que, no mínimo, haja completa realização daquelas que se relacionem com a manutenção e o desenvolvimento do ensino. Nada impede que, para além dessas atividades, a universidade possa definir outros cursos para a comunidade, como cursos de extensão, que, embora se relacionem ao ensino, guardam independência quanto a ele. Afastou o argumento de que, por ostentarem natureza autárquica ou fundacional, as universidades somente poderiam adotar o regime tributário para a obtenção de receitas, a implicar que o serviço desempenhado passasse a ser remunerado por taxa. Isso porque, em primeiro lugar, a adoção do regime de direito público, previsto no art. 37 da CF, não impõe, necessariamente, que a obtenção de receita seja exclusivamente pela via tributária. Ademais, o princípio da gratuidade veda, precisamente, a cobrança de prestação compulsória (CF, art. 205), como ocorre nas atividades de manutenção e desenvolvimento do ensino. Além disso, por serem as atividades extraordinárias desempenhadas de modo voluntário pelas universidades, pode ser estabelecida uma tarifa como contraprestação. Relembrou que, no julgamento da ADI 800/RS (DJE de 27.6.2014), se reconheceu que o traço característico de uma prestação estatal remunerada por taxa é a compulsoriedade, prevista no art. 3º do Código Tributário Nacional (CTN). Na mesma direção aponta ainda o Enunciado 545 da Súmula desta Corte (2). Essa diferenciação é fundamental para também estender às atribuições desempenhadas pelas universidades o entendimento sumulado pelo STF. Dessa forma, por não ser taxa a cobrança de mensalidade para os cursos não relacionados com a manutenção e o desenvolvimento do ensino, não está sujeita à legalidade estrita. Noutras palavras, podem as universidades regulamentar a forma de remuneração do serviço desempenhado. Ainda no que tange às limitações impostas às universidades, é mister registrar que os professores são servidores públicos e, como tal, destinam-se ao desempenho das tarefas indicadas nos seus cargos. Não podem, consequentemente, eximir-se de suas obrigações ordinárias para desempenhar aquelas que, por conveniência, a universidade decidiu oferecer ao público, mediante pagamento. Além disso, embora tenham autonomia para definir as atividades ofertadas ao público, as universidades devem ter em conta que prestam serviço público e, portanto, devem garantir os direitos dos usuários (CF, art. 175, II), observar a modicidade tarifária (CF, art. 175, III) e manter serviço de qualidade (CF, art. 206, VII), atendidas as exigências do órgão coordenador da educação (CF, art. 211, § 1º). Finalmente, a regulamentação dessas atividades deve ainda observar o princípio da gestão democrática do ensino (CF, art. 206, VI). Em suma, o Plenário concluiu ser preciso reconhecer que nem todas as atividades potencialmente desempenhadas pelas universidades se referem exclusivamente ao ensino. A função desempenhada por elas é muito mais ampla do que as formas pelas quais elas obtêm financiamento. Assim, o princípio da gratuidade não as obriga a perceber exclusivamente recursos públicos para atender sua missão institucional. Ele exige, porém, que, para todas as tarefas necessárias à plena inclusão social, missão do direito à educação, haja recursos públicos disponíveis para os estabelecimentos oficiais. O termo utilizado pela CF é que essas são as tarefas de manutenção e desenvolvimento do ensino. Consequentemente, são a elas que se estende o princípio da gratuidade. Nada obstante, é possível às universidades, no âmbito de sua autonomia didático-científica, regulamentar, em harmonia com a legislação, as atividades destinadas preponderantemente à extensão universitária, sendo-lhes, nessa condição, possível a instituição de tarifa. Vencido o ministro Marco Aurélio, que negava provimento ao recurso. Considerava que o inciso IV do art. 206 da CF prevê um princípio inafastável que garantiria a gratuidade do ensino em estabelecimentos oficiais, sem distinção, se de ensino básico, fundamental, superior, graduação ou pós-graduação. Além disso, o inciso I do art. 206 da CF asseguraria a igualdade de condições de acesso e permanência na escola. Não caberia ao intérprete, portanto, fazer distinção onde o texto constitucional não o fez, sob pena de gerar privilégio apenas aos que têm condições de arcar com os valores cobrados para os cursos. Em suma, as universidades públicas deveriam prestar o serviço educacional com base nas receitas previstas de forma exaustiva no texto constitucional (CF, art. 212) e, por serem públicas, haveriam de viabilizar, sem necessidade de qualquer pagamento, o acesso dos cidadãos em geral.
A Primeira Turma, por maioria, não admitiu a impetração, revogou a liminar anteriormente deferida em “habeas corpus” e determinou o restabelecimento da prisão preventiva do paciente. No caso, ele teve a prisão preventiva decretada em agosto de 2010, acusado de homicídio qualificado, sequestro, cárcere privado e ocultação de cadáver. Em março de 2013, o Tribunal do Júri o condenou a 22 anos e 3 meses de prisão, em regime fechado, tendo sido mantida a prisão preventiva. Posteriormente, em julgamento de “habeas corpus” impetrado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), o pedido foi denegado em decisão monocrática. O Colegiado afirmou que incide óbice ao conhecimento da ordem impetrada no Supremo Tribunal Federal (STF), uma vez que se impugna decisão monocrática de ministro do STJ, que determinou a extinção do “habeas corpus” [Enunciado 691 da Súmula do STF (1)]. Conforme jurisprudência consolidada, o exaurimento da instância recorrida é, como regra, pressuposto para ensejar a competência do STF. Salientou que, em hipóteses de teratologia (2) ou excepcionalidade (3), autoriza-se a apreciação de “habeas corpus” quando não encerrada a análise na instância competente. No presente caso, entretanto, não se apresenta nenhuma das hipóteses, pois a custódia cautelar foi mantida em sentença condenatória devidamente fundamentada e em respeito à soberania dos veredictos do Tribunal do Júri, e não há excesso de prazo atribuível direta e exclusivamente à inércia dos órgãos judiciários. Ressaltou que, em julgamento recente de caso análogo, foi proclamada a tese de que “a prisão do réu condenado por decisão do Tribunal do Júri, ainda que sujeita a recurso, não viola o princípio constitucional da presunção de inocência ou não culpabilidade” (4). Vencido o ministro Marco Aurélio, que concedia a ordem. Para ele, não seria aplicável o entendimento firmado no Enunciado 691 da Súmula do STF.
Não compete originariamente ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar execução individual de sentenças genéricas de perfil coletivo, inclusive aquelas proferidas em sede mandamental. Tal atribuição cabe aos órgãos judiciários competentes de primeira instância. Não compete originariamente ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar execução individual de sentenças genéricas de perfil coletivo, inclusive aquelas proferidas em sede mandamental. Tal atribuição cabe aos órgãos judiciários competentes de primeira instância. Com base nesse entendimento, a Segunda Turma resolveu questão de ordem em que discutida a competência para promover o cumprimento de sentença proferida em mandado de segurança coletivo, tendo em conta o disposto no art. 102, I, “m” (1), da Constituição. O Colegiado ressaltou que o cumprimento da sentença perante as instâncias ordinárias tem o condão, assim como ocorre em sede de ação civil pública, de aproximar a execução dos eventuais beneficiários, o que facilita o exercício do direito já reconhecido no mandado de segurança transitado em julgado.
A Segunda Turma concedeu “habeas corpus” para revogar prisão preventiva decretada em razão de descumprimento de acordo de colaboração premiada. A prisão preventiva do paciente foi restabelecida quando prolatada a sentença que o condenou a dezesseis anos e dois meses de prisão por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e por integrar organização criminosa, com fundamento no descumprimento dos termos do acordo celebrado. O Colegiado entendeu não haver relação direta entre a prisão preventiva e o acordo de colaboração premiada. Por essa razão, o descumprimento do acordado não justifica a decretação de nova custódia cautelar. Na liminar confirmada pela Turma, foi determinada a substituição da prisão por medidas cautelares alternativas. Naquela ocasião, observou-se não haver, do ponto de vista jurídico, relação direta entre o acordo de colaboração premiada e a prisão preventiva. A Lei 12.850/2013 não apresenta a revogação da prisão preventiva como benefício previsto pela realização de acordo de colaboração premiada. Tampouco há previsão de que, em decorrência do descumprimento do acordo, seja restabelecida prisão preventiva anteriormente revogada. Portanto, a celebração de acordo de colaboração premiada não é, por si só, motivo para revogação de prisão preventiva. A Turma concluiu no sentido de ser necessário verificar, no caso concreto, a presença dos requisitos da prisão preventiva, não podendo o decreto prisional ter como fundamento apenas a quebra do acordo.