Extradição e perda de nacionalidade brasileira

STF
859
Direito Constitucional
Geral
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Atualizado em 14 de novembro de 2025

Este julgado integra o

Informativo STF 859

Comentário Damásio

Conteúdo Completo

A Primeira Turma, por maioria, julgou procedente pedido formulado em extradição ajuizada pelo Governo dos Estados Unidos da América para assentar a possibilidade de entrega da extraditanda, brasileira nata naturalizada americana, acusada da suposta prática de homicídio doloso contra seu marido naquele país.

Inicialmente, a Turma relembrou que a perda da nacionalidade brasileira da extraditanda, decretada pelo Ministério da Justiça, teria sido validada no julgamento do Mandado de Segurança 33864/DF (DJE de 9.12.2016).

Asseverou que, na ocasião, a Turma, por maioria, firmou entendimento no sentido de que a Constituição Federal (CF), ao tratar da perda da nacionalidade brasileira, estabeleceu duas hipóteses: a) o cancelamento judicial da naturalização, em virtude da prática de ato nocivo ao interesse nacional, o que somente alcança brasileiros naturalizados (art. 12, § 4º, I); e b) a aquisição voluntária de outra nacionalidade secundária, o que alcança, indistintamente, brasileiros natos e naturalizados. Nesta última hipótese — a de aquisição de outra nacionalidade —, não se perde a nacionalidade brasileira em duas situações que constituem exceção à regra: a) tratar-se não de aquisição de outra nacionalidade, mas do mero reconhecimento de outra nacionalidade originária, considerada a natureza declaratória deste reconhecimento (art. 12, § 4º, II, “a”); e b) ter sido a outra nacionalidade imposta pelo Estado estrangeiro como condição de permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis (art. 12, § 4º, II, “b”). Entretanto, a situação da então impetrante não se enquadra em nenhuma dessas exceções, porque ela já detinha, desde muito antes de 1999, quando requereu a naturalização, o denominado “green card”, cuja natureza jurídica é a de visto de permanência e que confere, nos Estados Unidos da América, os direitos que alega ter pretendido adquirir com a naturalização: a permanência em solo norte-americano e a possibilidade de trabalhar naquele país. Em razão disso, desnecessária a obtenção da nacionalidade norte-americana para os fins que constitucionalmente revelam exceção à regra da perda da nacionalidade brasileira (CF, art. 12, II, § 4º, “a” e “b”). Ao contrário, a extraditanda pretendeu integrar-se àquela comunidade nacional, o que justamente constitui a razão central do critério adotado pelo constituinte originário para a perda da nacionalidade brasileira, critério este não excepcionado pela Emenda Constitucional 3/1994, que introduziu as exceções previstas nas alíneas “a” e “b” do § 4º do inciso II do art. 12 da CF.

Em seguida, a Turma considerou preenchidos todos os requisitos previstos na Lei 6.815/1980 e no Tratado de Extradição firmado entre o Brasil e os Estados Unidos. Também não vislumbrou nenhum dos óbices fixados no art. 77 da Lei 6.815/1980 ao deferimento do pedido: a) a extraditanda não é nacional brasileira; b) sua extradição foi requerida por Estado que mantém Tratado de Extradição com o Brasil; c) a pena máxima prevista para os crimes comuns — pelo qual responde — é superior a um ano de privação de liberdade (art. III do Tratado de Extradição); d) a prisão foi decretada por juízo regularmente instituído; e) o Brasil não é competente para o julgamento do crime; e f) o crime não tem conotação política.

No que concerne à alegação de não ter sido apresentada tradução juramentada em língua portuguesa dos documentos que instruem o pedido, o Colegiado entendeu que a expressão “tradução oficial”, utilizada pelo art. 80 do Estatuto do Estrangeiro, refere-se à tradução cuja autenticidade é certificada pelas autoridades do Estado requerente e cujo encaminhamento se dá por órgãos oficiais, o que confere a mencionada autenticidade, nos termos do art. IX do Tratado e da jurisprudência desta Corte (Ext 1100/República do Chile, DJE de 3.10.2008; Ext 1171/República da Argentina, DJE de 25.6.2010).

Observou que, no caso, a tradução foi certificada pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos da América, e os documentos encaminhados a esta Corte pelo Ministério da Justiça e pela via diplomática, não havendo falar-se em defeito de tradução.

Por fim, a Turma salientou não ser possível prosperar a cooperação quando houver o risco de imposição ao extraditando de penas não admitidas no ordenamento jurídico brasileiro. Assim, pode o Estado que coopera em matéria penal exigir o compromisso formal de que tais penas não serão eventualmente aplicadas ao extraditando entregue ao Estado requerente.

Dessa forma, deferiu o pedido de extradição e condicionou a entrega ao Estado requerente ao compromisso formal de: a) não aplicar penas interditadas pelo direito brasileiro, em especial a de morte ou prisão perpétua (CF, art. 5º, XLVII, “a” e “b”); b) observar o tempo máximo de cumprimento de pena previsto no ordenamento jurídico brasileiro de trinta anos (CP, art. 75); e c) detrair da pena o tempo que a extraditanda permaneceu presa para fins de extradição no Brasil.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que indeferia o pedido, ao fundamento de persistir a condição de brasileira nata da extraditanda.

Legislação Aplicável

CF, arts. art. 5º, XLVII, “a” e “b” e 12, II, § 4º, “a” e “b”;
Lei 6.815/1980, art. 77.

Informações Gerais

Número do Processo

1462

Tribunal

STF

Data de Julgamento

28/03/2017