Supremo Tribunal Federal • 4 julgados • 23 de ago. de 2024
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É compatível com a Constituição Federal de 1988 — e não ofende o seu art. 37, XXII — norma de lei estadual que dispõe integrarem a administração tributária as atividades de competência dos cargos de provimento efetivo da Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz) local. Na espécie, não há se falar em equiparação das carreiras da Sefaz amazonense. A expressa menção ao termo “administração tributária” não sugere a ideia de que todos os servidores do órgão podem executar atos administrativos nela definidos como próprios e exclusivos do cargo de auditor fiscal de tributos estaduais. A própria legislação impugnada, em outros dispositivos, encarrega-se de descrever o conjunto de atribuições e responsabilidades dos cargos e das carreiras do respectivo órgão. O texto constitucional, ao disciplinar as chamadas “administrações tributárias”, prescreve que as atividades essenciais ao funcionamento do Estado serão exercidas por servidores de carreiras específicas (1). Ele não define, entretanto, quais são as “atividades essenciais” ou as “carreiras específicas” e não faz qualquer alusão à carreira de auditor fiscal de tributos estaduais. Relativamente ao cargo de “Técnico de Arrecadação de Tributos Estaduais”, posteriormente designado “Controlador de Arrecadação da Receita Estadual”, observa-se que as atividades descritas na norma são diferentes das do cargo de auditor fiscal: aquele não possui, por exemplo, incumbências relacionadas à gestão tributária — entre as quais se destaca a constituição de crédito tributário —, mas apenas os encargos relacionados à gestão da arrecadação. Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, conheceu parcialmente da ação e, nessa extensão, a julgou improcedente para declarar compatíveis com a Constituição Federal de 1988 as seguintes disposições da Lei nº 2.750/2002 do Estado do Amazonas: (i) o art. 3º-A (2), incluído pela Lei amazonense nº 3.500/2010; e (ii) o texto “NÍVEL SUPERIOR COMPLETO – CONTROLADOR DE ARRECADAÇÃO DA RECEITA ESTADUAL - DESCRIÇÃO DE ATIVIDADES: Encargos de gestão da arrecadação, referente às atividades de controle e auditoria na rede arrecadadora, execução e controle de processos de arrecadação, cadastro, cobrança administrativa, serviço administrativo do desembaraço de documentos fiscais e atendimento especializado ao público” constante do Anexo II (3), na redação dada pela Lei amazonense nº 5.994/2022. (1) CF/1988: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) XXII – as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, atividades essenciais ao funcionamento do Estado, exercidas por servidores de carreiras específicas, terão recursos prioritários para a realização de suas atividades e atuarão de forma integrada, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais, na forma da lei ou convênio.” (2) Lei nº 2.750/2002 do Estado do Amazonas: “Art. 3º A. As atividades de competência dos cargos de provimento efetivo da Secretaria de Estado da Fazenda integram a Administração Tributária, atividade essencial ao funcionamento do Estado, desempenhada no âmbito do Estado do Amazonas pela SEFAZ.” (incluído pela Lei nº 3.500/2010 do Estado do Amazonas) (3) Anexo II da Lei nº 2.750/2002 do Estado do Amazonas: “REQUISITOS DE QUALIFICAÇÃO MÍNIMA E DESCRIÇÃO DE ATIVIDADES (...) QUALIFICAÇÃO MÍNIMA: NÍVEL SUPERIOR COMPLETO – CARGO: CONTROLADOR DE ARRECADAÇÃO DA RECEITA ESTADUAL – DESCRIÇÃO DE ATIVIDADES: Encargos de gestão da arrecadação, referente às atividades de controle e auditoria na rede arrecadadora, execução e controle de processos de arrecadação, cadastro, cobrança administrativa, serviço administrativo do desembaraço de documentos fiscais e atendimento especializado ao público.” (redação dada pela Lei nº 5.994/2022 do Estado do Amazonas)
“A execução de créditos individuais e divisíveis decorrentes de título judicial coletivo, promovida por substituto processual, não caracteriza o fracionamento de precatório vedado pelo § 8º do art. 100 da Constituição.” A vedação ao fracionamento de créditos judiciais devidos pela Fazenda Pública (CF/1988, art. 100, § 8º) não alcança as execuções individuais de pequeno valor promovidas por substituto processual, cujo valor global do crédito supera o limite para requisição de pequeno valor (RPV). O fator relevante para identificar se há o fracionamento vedado pelo dispositivo citado é a natureza do direito do crédito exigido (1). Nesse contexto, a qualidade coletiva e/ou indivisível do direito não é extraída das características do sujeito que pleiteia em juízo, mas em razão da natureza jurídica dos interesses protegidos. Na espécie, o título executivo originou-se de uma ação coletiva e o sindicato demandou o cumprimento de sentença como substituto processual, com a apresentação de cálculo individualizado do crédito de cada substituído/servidor interessado. Destarte, a execução tanto poderia ser promovida pelo próprio servidor ou por um substituto processual, na medida em que o direito individual e divisível a ser satisfeito, em qualquer hipótese, é o mesmo. Ademais, conforme jurisprudência desta Corte (2), não há fracionamento de precatório no pagamento de débitos judiciais decorrentes de individualização de créditos de litisconsortes facultativos. Com base nesses entendimentos, o Plenário, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada (Tema 1.317 da repercussão geral), bem como (i) reafirmou a jurisprudência dominante sobre a matéria (3) para dar provimento ao recurso extraordinário e determinar que a forma de pagamento de débito judicial pela Fazenda Pública observe o valor individualizado do crédito de cada servidor/substituído pelo sindicato recorrente; e (ii) fixou a tese anteriormente citada. (1) CF/1988: “Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (...) § 8º É vedada a expedição de precatórios complementares ou suplementares de valor pago, bem como o fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução para fins de enquadramento de parcela do total ao que dispõe o § 3º deste artigo.” (2) Precedente citado: RE 568.645 (Tema 148 RG). (3) Precedentes citados: ARE 1.478.265, ARE 1.477.856, ARE 1.478.034, ARE 1.456.871, ARE 1.477.777, ARE 1.478.143, ARE 1.480.612 e ARE 1.468.892 (decisões monocráticas).
“É inconstitucional, por violação aos arts. 130 e 75 da CF/1988, norma estadual que confere autonomia administrativa e orçamentária ao Ministério Público Estadual junto ao Tribunal de Contas, garantida a independência funcional de seus membros e os meios necessários para o desempenho da função”. O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (“Ministério Público especial”) encontra-se organicamente inserido na estrutura da respectiva Corte de Contas, motivo pelo qual não detém autonomia administrativa e orçamentária. A Constituição Federal não concedeu ao órgão do Ministério Público especial as garantias institucionais de autonomia administrativa e orçamentária, visto que integra, em termos estruturais, a organização administrativa do próprio Tribunal de Contas, órgão auxiliar do Poder Legislativo na incumbência do controle externo (1). Nesse contexto, à luz do princípio da simetria (CF/1988, art. 75), as normas relativas à organização, composição e fiscalização do Tribunal de Contas da União devem ser observadas no desenho institucional dos demais Tribunais de Contas dos estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais de Contas dos municípios (2). Conforme jurisprudência desta Corte (3), o texto constitucional (CF/1988, art. 130), com o intuito de proteger os membros do Ministério Público especial no desempenho de suas atribuições, veicula norma de extensão obrigatória tão somente com relação às cláusulas de garantias subjetivas, que se referem estritamente aos direitos — vitaliciedade, inamovibilidade, irredutibilidade e independência funcional (CF/1988, art. 128, § 5º, I) —, às vedações (CF/1988, art. 128, § 5º, II), e à forma de investidura na carreira (CF/1988, art. 129, §§ 3º e 4º). Todas as demais prerrogativas de ordem objetiva-institucional dispensadas ao Ministério Público comum, como a autonomia administrativa, financeira e orçamentária, são inaplicáveis ao Parquet que atua junto ao Tribunal de Contas. Por outro lado, a fim de que os membros do Ministério Público de Contas possam exercer suas funções de modo independente (autonomia funcional), o respectivo Tribunal de Contas deve garantir todos os recursos necessários, entre eles, os recursos humanos e financeiros. Ademais, qualquer medida arbitrária, por parte do presidente do Tribunal de Contas, que comprometa a independência funcional do respectivo órgão ministerial deve ser invalidada por desvio de finalidade e ensejará a sua responsabilização administrativa e criminal. Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, (i) julgou parcialmente procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade das expressões “independência financeira e administrativa, dispondo de dotação orçamentária global própria”, contida no art. 2º da Lei Complementar nº 09/1992 (4), e “independência financeira e administrativa, dispondo de dotação orçamentária global própria”, contida no art. 2º da Lei Complementar nº 86/2013 (5), ambas do Estado do Pará; (ii) julgou improcedente a ação quanto à expressão “independência funcional”, contida no art. 2º da Lei Complementar nº 86/2013 do Estado do Pará; (iii) fixou a tese anteriormente citada; e (iv) atribuiu eficácia pro futuro ao julgamento, a fim de que passe a produzir efeitos em 1º de janeiro de 2026. (1) Precedente citado: ADI 789. (2) Precedente citado: ADI 3.307. (3) Precedentes citados: ADI 2.378, ADI 3.804, ADI 4.725 MC e ADI 5.117. (4) Lei Complementar nº 09/1992 do Estado do Pará: “Art. 2º. O Ministério Público Especial de que trata esta Lei e na forma da Constituição Federal e da Constituição do Pará, tem como princípios institucionais: a unidade, a individualidade e a independência financeira e administrativa, dispondo de dotação orçamentária global própria”. (5) Lei Complementar nº 86/2013 do Estado do Pará: “Art. 2º. O Ministério Público de Contas dos Municípios do Estado do Pará de que trata esta Lei Complementar e na forma da Constituição Federal e Estadual, tem como princípios institucionais: a unidade, a individualidade e a independência funcional, financeira e administrativa, dispondo de dotação orçamentária global própria.”
É constitucional — por não versar sobre matéria relativa à organização, à estrutura interna, ao funcionamento ou ao exercício do poder fiscalizatório dos Tribunais de Contas (CF/1988, arts. 73, 75 e 96, II) — lei estadual de iniciativa parlamentar que altera a destinação da receita arrecadada com a cobrança de multas aplicadas pela Corte de Contas local (recursos que são de titularidade da Fazenda estadual). Conforme a jurisprudência dessa Corte, as receitas públicas provenientes de multas aplicadas pelos Tribunais de Contas estaduais pertencem ao tesouro do ente público beneficiado pela decisão de imputação de débito ou mantenedor da respectiva Corte de Contas. Destarte, os valores pertencem aos estados e aos municípios, a depender da modalidade de responsabilidade financeira imposta ao penalizado e da necessidade de recomposição patrimonial do ente público prejudicado (1). Na espécie, com a redação original da Lei nº 8.411/2005 do Estado de Mato Grosso, as receitas decorrentes de aplicação de multas impostas pelo Tribunal de Contas estadual eram destinadas ao Fundo de Reaparelhamento e Modernização do Tribunal de Contas do estado. Com a alteração legislativa promovida pela Lei estadual nº 11.085/2020, essas receitas passaram a ser destinadas ao Fundo Estadual de Saúde e ao Centro de Apoio e Suporte à Inclusão da Educação Especial (CASIES). Com base nesses entendimentos, o Plenário, por unanimidade, julgou improcedente a ação para assentar a constitucionalidade da Lei nº 11.085/2020 do Estado de Mato Grosso (2). (1) Precedentes citados: RE 223.037, ARE 823.347 (Tema 768 RG), ADI 4.070, RE 1.003.433 (Tema 642 RG) e ADPF 1.011. (2) Lei nº 11.085/2020 do Estado de Mato Grosso: “Fica acrescido o parágrafo único e seus incisos I, II e III ao art. 2º da Lei nº 8.411, de 27 de dezembro de 2005, com a seguinte redação: ‘Art. 2º (...) (...) Parágrafo único. O percentual de 50% (cinquenta por cento) da receita arrecadada com a cobrança das multas aplicadas pelo Tribunal de Contas do Estado, de que trata o inciso VI do caput deste artigo, será transferido ao Fundo Estadual de Saúde e os outros 50% (cinquenta por cento) serão transferidos ao CASIES - Centro de Apoio e Suporte à Inclusão da Educação Especial, até o dia 05 (cinco) do mês subsequente à sua arrecadação: I - os valores repassados ao Fundo Estadual de Saúde serão transferidos pela Secretaria de Estado de Saúde aos Fundos Municipais de Saúde, de forma regular e automática, na modalidade fundo a fundo, a todos os Municípios que não atingirem o Índice de Desenvolvimento Humano - IDH de 0,7 (sete décimos), de acordo com dados oficiais obtidos junto à Associação Mato-grossense dos Municípios - AMM, até o dia 15 (quinze) de cada mês; II - o repasse financeiro do Fundo Estadual de Saúde aos Fundos Municipais de Saúde visa, exclusivamente, ao custeio de ações e serviços públicos de saúde de atenção primária e de média complexidade nos Municípios selecionados; III - os valores repassados ao CASIES - Centro de Apoio e Suporte à Inclusão da Educação Especial, visa, exclusivamente, ao custeio da educação inclusiva no Estado de Mato Grosso.’ Art. 2º Esta Lei será regulamentada de acordo com o disposto no art. 38-A da Constituição Estadual Constituição Estadual. Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”