Supremo Tribunal Federal • 7 julgados • 05 de ago. de 2022
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É constitucional a instituição do Programa de Monitoramento da Qualidade dos Combustíveis (PMQC) por normativo da Agência Nacional do Petróleo (ANP), na medida em que o ato regulatório apresenta correspondência direta com as diretrizes e os propósitos conferidos por sua lei instituidora. As agências reguladoras, assim como os Poderes, instituições e órgãos do poder público, submetem-se ao princípio da legalidade (CF/1988, art. 37, caput) (1). No caso, as normas técnicas emanadas pela Resolução 790/2016 da ANP — que instituiu o PMQC — inserem-se no espaço de conformação previsto no art. 8º da Lei 9.478/1997 (2), que atribui à agência reguladora a implementação da política nacional de petróleo, gás natural e biocombustíveis com ênfase na proteção dos interesses dos consumidores quanto a preço, qualidade e oferta dos produtos. Ademais, a Resolução não transferiu a terceiros parcela da competência fiscalizatória que é própria da ANP, mas conferiu tratamento isonômico na atribuição dos custos do monitoramento entre todos os agentes econômicos da cadeia de comercialização de combustíveis, que, por auferirem os lucros da atividade, também possuem o dever de assegurar perante o consumidor a qualidade dos produtos oferecidos. Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, conheceu em parte da ação e, nesta extensão, a julgou improcedente. (1) Precedentes citados: ADI 4093; ADI 4954; RMS 28487; e ADI 4874. (2) Lei 9.478/1997: “Art. 8º. A ANP terá como finalidade promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis, cabendo-lhe: I - implementar , em sua esfera de atribuições, a política nacional de petróleo, gás natural e biocombustíveis, contida na política energética nacional, nos termos do Capítulo I desta Lei, com ênfase na garantia do suprimento de derivados de petróleo, gás natural e seus derivados, e de biocombustíveis, em todo o território nacional, e na proteção dos interesses dos consumidores quanto a preço, qualidade e oferta dos produtos; (...) XVII - exigir dos agentes regulados o envio de informações relativas às operações de produção, importação, exportação, refino, beneficiamento, tratamento, processamento, transporte, transferência, armazenagem, estocagem, distribuição, revenda, destinação e comercialização de produtos sujeitos à sua regulação;”
“São inconstitucionais o Decreto nº 3.048/99 e a Portaria MPAS nº 1.135/01 no que alteraram a base de cálculo da contribuição previdenciária incidente sobre a remuneração paga ou creditada a transportadores autônomos, devendo o reconhecimento da inconstitucionalidade observar os princípios da congruência e da devolutividade.” É inconstitucional, por afronta ao princípio da legalidade estrita, a majoração da base de cálculo de contribuição social por meio de ato infralegal. No caso, o Decreto 3.048/1999 e a Portaria 1.135/2001 do Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS) alteraram a base de cálculo do tributo de que dispõem ao estipular que, no lugar da remuneração efetivamente paga aos transportadores autônomos — conforme critério estabelecido pela Lei 8.212/1991 —, se considerasse o resultado de um percentual (11,71% ou 20%) incidente sobre o valor bruto do frete, carreto ou transporte de passageiros. Com isso, a alíquota da contribuição previdenciária passou a não mais incidir sobre a remuneração efetivamente paga, e sim sobre um novo montante, cujo valor previsto abrange, além da remuneração do transportador autônomo, outras parcelas, como combustível, seguros e desgaste do equipamento. Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, reconheceu a existência da repercussão geral da questão constitucional suscitada (Tema 1223 RG) e, no mérito, também por unanimidade, reafirmou a jurisprudência dominante sobre a matéria (1) para dar provimento ao recurso extraordinário, assentando a inconstitucionalidade do Decreto 3.048/1999 e da Portaria MPAS 1.135/2001. (1) Precedentes citados: RMS 25476; RE 762028 AgR; e RE 894605 AgR-ED-AgR
Os partidos políticos podem, no exercício de sua autonomia constitucional, estabelecer a duração dos mandatos de seus dirigentes, desde que compatível com o princípio republicano da alternância do poder concretizado por meio da realização de eleições periódicas em prazo razoável. É inconstitucional a previsão do prazo de até oito anos para a vigência dos órgãos provisórios dos partidos, para evitar distorções ao claro significado de “provisoriedade”, notadamente porque, nesse período, podem ser realizadas distintas eleições em todos os níveis federativos. É constitucional a previsão de concessão de anistia às cobranças, devoluções ou transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições feitas em anos anteriores por servidores públicos que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político. Os partidos políticos podem, no exercício de sua autonomia constitucional, estabelecer a duração dos mandatos de seus dirigentes, desde que compatível com o princípio republicano da alternância do poder concretizado por meio da realização de eleições periódicas em prazo razoável. O ideal democrático firma-se na temporalidade dos mandatos, o que viabiliza sua renovação e alternância de poder, motivo pelo qual os princípios democrático e republicano não autorizam que a autonomia assegurada às agremiações partidárias seja interpretada contrariamente à Constituição, autorizando a perpetuação dos mandatos das lideranças partidárias (1). É inconstitucional a previsão do prazo de até oito anos para a vigência dos órgãos provisórios dos partidos (2), para evitar distorções ao claro significado de “provisoriedade”, notadamente porque, nesse período, podem ser realizadas distintas eleições em todos os níveis federativos. O poder não deve ser exercido por tempo indeterminado ou excessivo, sendo imprescindível a apuração democrática da vontade dos filiados. Ocorre que as comissões provisórias normalmente são compostas por pessoas não eleitas por seus pares, mas indicadas pela direção do partido e com sucessivas reconduções. Essa circunstância é capaz de minar a democracia interna, pois apta a acarretar a falta de autenticidade dos partidos políticos, culminando em sérios reflexos na legitimidade do sistema político. Ademais, o Supremo Tribunal Federal não pode, sob pena de atuar como legislador positivo, estabelecer um único prazo, aplicável indistintamente a todas as agremiações e em todos os cenários. Cabe à Justiça Eleitoral analisar, na apreciação do registro dos estatutos ou quando trazida a questão em casos concretos, a constitucionalidade e legalidade do prazo de vigência dos órgãos provisórios dos partidos políticos. Nesse contexto, o Tribunal, especificamente quanto a essa parte na qual reconhece a inconstitucionalidade da norma, modulou os seus efeitos exclusivamente a partir de janeiro de 2023, prazo posterior ao encerramento do presente ciclo eleitoral, após o qual o TSE poderá analisar a compatibilidade dos estatutos com o que ora decidido. É constitucional a previsão de concessão de anistia às cobranças, devoluções ou transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições feitas em anos anteriores por servidores públicos que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político. A pecúnia a ser anistiada (Lei 9.096/1995, art. 55-D) é de cunho eleitoral e não ostenta caráter de tributo, razão pela qual não compõe o orçamento público, afastando-se do campo de abrangência do art. 113 do ADCT — cujo objeto de proteção é a receita de caráter fiscal (3). Assim, é desnecessária a prévia estimativa acerca de impacto financeiro e orçamentário por parte das proposições legislativas que prevejam a renúncia de seus recursos financeiros. Com base nesses entendimentos, o Plenário, por unanimidade, julgou parcialmente procedente a ação e modulou os efeitos da decisão no trecho em que reconhece a inconstitucionalidade da norma. (1) Precedentes citados: ADI 5617 e ADI 5311. (2) Lei 9.096/1995: “Art. 3º É assegurada, ao partido político, autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento. (...) § 3º O prazo de vigência dos órgãos provisórios dos partidos políticos poderá ser de até 8 (oito) anos (Incluído pela Lei nº 13.831, de 2019)”. (3) ADCT: “Art. 113. A proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 95, de 2016)”.
“É defeso o pagamento de remuneração em valor inferior ao salário mínimo ao servidor público, ainda que labore em jornada reduzida de trabalho.” É inconstitucional remunerar servidor público, mesmo que exerça jornada de trabalho reduzida, em patamar inferior a um salário mínimo (1). O direito fundamental ao salário mínimo é previsto constitucionalmente para garantir a dignidade da pessoa humana por meio da melhoria de suas condições de vida (CF/1988, art. 7º, IV), garantia que foi estendida aos servidores públicos sem qualquer sinalização no sentido da possibilidade de flexibilizá-la no caso de jornada reduzida ou previsão em legislação infraconstitucional (CF/1988, art. 39, § 3º). A leitura conjunta dos dispositivos constitucionais atinentes ao tema, somado ao postulado da vedação do retrocesso de direitos sociais, denota a finalidade de assegurar o mínimo existencial aos integrantes da Administração Pública Direta e Indireta com a fixação do menor patamar remuneratório admissível (4), especialmente se consideradas as limitações inerentes ao regime jurídico dos servidores públicos, cujas características se distinguem do relativo às contratações temporárias ou originadas de vínculos decorrentes das recentes reformas trabalhistas. Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 900 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário para devolver os autos ao tribunal de origem para continuidade de julgamento, a fim de que sejam decididas as demais questões postas no apelo, observados os parâmetros ora decididos. (1) Precedentes citados: AI 815869 AgR; RE 565621 (monocrática); AI 742870 (monocrática); ARE 660010 (Tema 514 RG); ARE 893698 (monocrática); ARE 891944 (monocrática); ARE 736433 (monocrática); ARE 887646 (monocrática); ARE 891945 (monocrática); ARE 663068 (monocrática); ADI 2238. (2) Precedentes citados: ADI 1442; RE 340599; RE 582019 QO (Tema 142 RG).
É inconstitucional condicionar o benefício de isenção fiscal do IPVA quanto à propriedade de veículos utilizados para o serviço de transporte escolar com a filiação de seus motoristas profissionais autônomos a sindicato ou cooperativa. Não há justificativa razoável para se conferir tratamentos distintos a motoristas que prestam os mesmos serviços de transporte escolar pelo simples fato de possuírem ou não vínculo com as referidas entidades associativas. Esse critério de discrímen não guarda qualquer conexão com os objetivos da política pública envolvida na isenção, além de contrariar os interesses constitucionais nela envolvidos, quais sejam, baratear e melhorar o transporte escolar e impulsionar o acesso à educação. Além disso, a condição imposta pela norma impugnada, de forma indireta, constrange o proprietário de veículo a se filiar às entidades associativas a fim de usufruir da benesse fiscal, e compele os já filiados a permanecerem nessa posição, em evidente afronta aos princípios da isonomia, da liberdade sindical e da liberdade de associação (1). Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, conheceu em parte da ação e, nesta extensão, a julgou procedente para declarar a inconstitucionalidade da expressão “prestado por cooperativa ou sindicato ou contratado pela Prefeitura Municipal, individualmente ou por meio de cooperativa ou sindicato” constante do art. 3º, XVII, da Lei 14.937/2003 do Estado de Minas Gerais, na redação conferida pela Lei 18.726/2010, sem, contudo, invalidar a norma que prevê a isenção de IPVA referida no dispositivo na hipótese de contratação do serviço de transporte escolar pela prefeitura (2). (1) Precedentes citados: ADI 1655 e ADI 3464 (2) Lei 14.937/2003 do Estado de Minas Gerais: “Art. 3º - É isenta do IPVA a propriedade de: (…) XVII - veículo de motorista profissional autônomo, ainda que gravado com o ônus da alienação fiduciária, ou em sua posse em decorrência de contrato de arrendamento mercantil ou leasing por ele celebrado, desde que utilizado para o serviço de transporte escolar prestado por cooperativa ou sindicato ou contratado pela Prefeitura Municipal, individualmente ou por meio de cooperativa ou sindicato (Inciso com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 18.726, de 14/1/2010)"
É inconstitucional, por violação à competência privativa da União para legislar sobre direito civil (CF/1988, art. 22, I), norma estadual que impede as instituições particulares de ensino superior de recusarem a matrícula de estudantes inadimplentes e de cobrar juros, multas, correção monetária ou quaisquer outros encargos durante o período de calamidade pública causado pela pandemia da COVID-19. Na linha da jurisprudência consolidada desta Corte, trata-se de matérias obrigacional e contratual, pertencentes ao ramo do direito civil, razão pela qual somente podem ser reguladas por meio de normas federais (1). Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, em julgamento conjunto, julgou procedentes as ações para declarar a inconstitucionalidade do art. 6º, caput, e parágrafo único, da Lei 8.915/2020 do Estado do Rio de Janeiro (2). (1) Precedentes citados: ADI 6423; ADI 6435; ADI 6445; e ADI 6448. (2) Lei 8.915/2020 do Estado do Rio de Janeiro: “Art. 6º O estabelecimento particular de ensino superior não poderá recusar a matrícula ou a inscrição em disciplinas de estudante que tenha ficado inadimplente durante a vigência do estado de calamidade pública instituído pela Lei nº 8.794, de 17 de abril de 2020. Parágrafo único. O estabelecimento particular de ensino superior não poderá cobrar multas, juros, correção monetária ou outros encargos nas mensalidades com atraso de até 30 (trinta) dias após o vencimento, durante o período em que perdurar o estado de calamidade pública decorrente da pandemia do novo coronavírus.”
É constitucional a instituição, por meio de lei estadual, de taxas de controle, monitoramento e fiscalização de atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos minerários (TFRM). A base de cálculo das taxas minerárias deve guardar razoável proporcionalidade entre a quantidade de minério extraído e o dispêndio de recursos públicos com a fiscalização dos contribuintes, observados os princípios da proibição do confisco e da precaução ambiental. É constitucional a instituição, por meio de lei estadual, de taxas de controle, monitoramento e fiscalização de atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos minerários (TFRM). Os estados-membros possuem competência administrativa fiscalizatória sobre recursos hídricos e minerais, desde que informado pelo princípio da subsidiariedade, emanado de uma concepção própria do federalismo cooperativo brasileiro (1), de modo que é possível desempenharem, quando traduzível em serviço público ou poder de polícia, atividade administrativa remunerada mediante taxa (CF/1988, art. 145, II). A base de cálculo das taxas minerárias deve guardar razoável proporcionalidade entre a quantidade de minério extraído e o dispêndio de recursos públicos com a fiscalização dos contribuintes, observados os princípios da proibição do confisco e da precaução ambiental. Nesse contexto, é razoável utilizar o volume de minério extraído como quantificação tributária, pois, quanto maior ele for, maior pode ser o impacto social e ambiental do empreendimento, motivo pelo qual mais elevado também deve ser o grau de controle e fiscalização do poder público (2). No caso, há correlação entre o valor das taxas e os custos estatais, de modo que as exações são suportáveis pelos contribuintes, descabendo arguir eventual desproporcionalidade, em especial diante dos expressivos lucros dessas empresas. Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, em julgamento conjunto, julgou improcedente as ações nas partes que foram conhecidas. (1) Precedentes citados: ADI 6211; ADI 5512; e ADI 5480. (2) Precedente citado: ADI 2551 MC-QO.