Contribuição ao PIS/Pasep e Cofins: legalidade tributária e anterioridade nonagesimal

STF
1002
Direito Tributário
Geral
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Atualizado em 14 de novembro de 2025

Este julgado integra o

Informativo STF 1002

Comentário Damásio

Resumo

A constitucionalidade da flexibilização do princípio da legalidade tributária deve ser verificada de acordo com cada espécie tributária e à luz do caso concreto. As normas editadas pelo Poder Executivo que majorem alíquotas da contribuição para PIS/Pasep e a Cofins devem observar a anterioridade nonagesimal (CF, art. 150, III, “c”) (2). É constitucional a revogação pela Lei 10.865/2004 das normas legais que davam ao contribuinte direito de apurar, no âmbito do sistema não cumulativo de cobrança da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins, créditos em relação a despesas financeiras decorrente de empréstimos e financiamentos.

Conteúdo Completo

É constitucional a flexibilização da legalidade tributária constante do § 2º do art. 27 da Lei 10.865/2004 (1), no que permitiu ao Poder Executivo, prevendo as condições e fixando os tetos, reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) incidentes sobre as receitas financeiras auferidas por pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo, estando presente o desenvolvimento de função extrafiscal.

A constitucionalidade da flexibilização do princípio da legalidade tributária deve ser verificada de acordo com cada espécie tributária e à luz do caso concreto.
As normas editadas pelo Poder Executivo que majorem alíquotas da contribuição para PIS/Pasep e a Cofins devem observar a anterioridade nonagesimal (CF, art. 150, III, “c”) (2).
É constitucional a revogação pela Lei 10.865/2004 das normas legais que davam ao contribuinte direito de apurar, no âmbito do sistema não cumulativo de cobrança da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins, créditos em relação a despesas financeiras decorrente de empréstimos e financiamentos.


A constitucionalidade da flexibilização do princípio da legalidade tributária deve ser verificada de acordo com cada espécie tributária e à luz do caso concreto.

Não há ampla e irrestrita liberdade para o legislador realizar diálogo com o regulamento no tocante aos aspectos da regra matriz de incidência tributária. A possibilidade de haver a flexibilização do princípio deve ser interpretada com temperamento, de outra maneira, haverá sério risco de sua banalização.

Exige-se maior presença do legislador no tratamento de tributo que possua alto grau de coatividade, como é a exação cujo pagamento não decorra de benefício imediato conferido ao contribuinte. A característica da retributividade imediata reduz o grau de coatividade dos tributos: o patrimônio afetado do contribuinte acabará sendo, de alguma forma, compensado imediatamente. 

Já os processos em debate tratam da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins, cujos pagamentos não decorrem de benefício imediato concedido ao próprio contribuinte, pessoa jurídica. Essas contribuições possuem traço característico da vinculação à finalidade de custeio da seguridade social. Portanto, detêm alta carga de coatividade. Conservando suas naturezas tributárias, elas se aproximam dos impostos.

Extrai-se do texto constitucional que a simples previsão em lei do valor máximo do tributo não é suficiente para autorizar a flexibilização da legalidade tributária em relação à alíquota de imposto. Assim, para a flexibilização da legalidade tributária relativa às alíquotas das contribuições questionadas, é preciso o estabelecimento em lei, em sentido estrito, de condições e do valor máximo das exações. Além disso, é imprescindível que haja uma carga de função extrafiscal a ser desenvolvida pelo regulamento, de modo a justificar a manipulação das alíquotas pelo Poder Executivo. Ressalta-se que a atividade estatal subjacente à função extrafiscal costumeiramente depende de apreensão de variados aspectos da realidade fenomênica pela Administração, que tem natural proximidade com os fatos.

As normas editadas pelo Poder Executivo que majorem alíquotas da contribuição para PIS/Pasep e a Cofins devem observar a anterioridade nonagesimal (CF, art. 150, III, “c”) (2).

Se a lei que, mesmo de forma indireta, eleva a carga tributária do contribuinte é obrigada a observar a regra constitucional, tenha ou não função extrafiscal, também o regulamento deve respeitá-la. Contudo, não se aplica a anterioridade geral (CF, art. 150, III, b) (3), porquanto afastada pelo texto constitucional (CF, art. 195, § 6º) (4).

É constitucional a revogação pela Lei 10.865/2004 das normas legais que davam ao contribuinte direito de apurar, no âmbito do sistema não cumulativo de cobrança da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins, créditos em relação a despesas financeiras decorrente de empréstimos e financiamentos.

Possível a revogação pelo legislador de norma legal a respeito da possibilidade de apuração de determinados créditos dentro do sistema. O modelo legal, apesar de complexo e confuso, não atenta contra o conteúdo mínimo da não cumulatividade (CF, art. 195, § 12) (5). Ao contrário do que dispôs para o IPI e o ICMS, o texto constitucional não trouxe qual seria a técnica tributária à qual o legislador deveria se ater no tratamento da não cumulatividade das contribuições sociais para a seguridade social incidentes sobre receita ou faturamento. Ele tem ampla liberdade para tratar do modelo não cumulativo de cobrança dessas contribuições.

Em julgamento conjunto, o Plenário, por maioria, negou provimento ao recurso extraordinário paradigma do Tema 939 da repercussão geral. Igualmente em votação majoritária, julgou parcialmente procedente o pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade para dar interpretação conforme à Constituição aos §§ 8º e 9º do art. 5º da Lei 9.718/1998, incluídos pela Lei 11.727/2008, estabelecendo que as normas editadas pelo Poder Executivo com base nesses parágrafos devem observar a anterioridade nonagesimal prevista no art. 150, III, c, do texto constitucional. Em ambos os feitos, vencido o ministro Marco Aurélio.

(1) Lei 10.865/2004: “Art. 27. O Poder Executivo poderá autorizar o desconto de crédito nos percentuais que estabelecer e para os fins referidos no art. 3º das Leis nº s 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e 10.833, de 29 de dezembro de 2003, relativamente às despesas financeiras decorrentes de empréstimos e financiamentos, inclusive pagos ou creditados a residentes ou domiciliados no exterior. (...) § 2º O Poder Executivo poderá, também, reduzir e restabelecer, até os percentuais de que tratam os incisos I e II do caput do art. 8º desta Lei, as alíquotas da contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de não-cumulatividade das referidas contribuições, nas hipóteses que fixar.”

(2) CF: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) III – cobrar tributos: (...) c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;”

(3) CF: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) III – cobrar tributos: (...) b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;”

(4) CF: “Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (...) § 6º As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, ‘b’.”

(5) CF: “Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (...) § 12. A lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, b; e IV do caput, serão não-cumulativas.”

Legislação Aplicável

Lei 10.865/2004, art. 27; CF, art. 150, III, b e c, e art. 195, §§ 6° e 12.

Informações Gerais

Número do Processo

1043313

Tribunal

STF

Data de Julgamento

10/12/2020